O projeto final de planejamento em permacultura precisa apresentar um plano para autossuficiência, segurança alimentar, hídrica e energética, em curto, médio e longo prazo. Ele deverá quantificar os processos e prever a segurança financeira, caso necessária, para se alcançar a autossuficiência.
Esse é o ponto da formação em que o instrutor deve deixar os participantes desguarnecidos de opiniões terceiras, pois cada projeto deve levar a identidade do seu planejador. Claro que algumas dicas podem ser fornecidas. Por exemplo, Avis et al. (2021) sugerem cinco passos para o planejamento permacultural:
- Passo 1 – Tenha clareza de sua visão, valores e recursos;
- Passo 2 – Faça um diagnóstico dos seus recursos para pontos fortes, fracos, oportunidades e ameaças.
- Passo 3 – Planeje seus recursos para atender à sua visão e valores;
- Passo 4 – Implemente o planejamento que melhorará seu recurso mais fraco;
- Passo 5 – Monitore seus recursos por indicadores de bem-estar ou sofrimento.
Há ainda alguns itens que devem ser analisados para se estabelecer uma linha lógica de planejamento, buscando pragmatismo nas decisões de cada permaculturando.
Linha de desenvolvimento | Fase do planejamento da propriedade/território | ||||
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Inventário | Avaliação | Estratégia | Planejamento | Implementação | |
Paisagem natural | Geologia, geomorfologia, clima, solos, flora e fauna | Sistemas de paisagem e componentes | Sistemas de paisagem e componentes | Sistemas de paisagem e componentes | Sistemas de paisagem e componentes |
Infraestrutura | Sistemas e estruturas existentes | Potenciais e limitações | Redes e nós (elos) | Plano e especificações | Agendas de manutenção e atualização |
Empresa (monetário) | Pesquisa de tecnologias e métodos | Análise SWOT* | Plano de negócios | Planejamento e especificações Finanças Tecnologia de trabalho | Programação e etapas |
Doméstico/comunidade (não monetário) | Pesquisa de campo | Setores e zonas | Conceito do planejamento | Lista de espécies, ações e materiais | Ciclos sazonais |
SWOT – Análise de determinação das forças, fraquezas, ameaças e oportunidades de um processo. Quadro baseado nas estratégias de planejamento publicadas em HOLMGREN, David. Trees on the Treeless Plains: Revegetation Manual for the Volcanic Landscapes of Central Victoria. Victoria, Australia: Holmgren Design Services, 1994 (republished as Ebook 2006). |
O que cada participante ou grupo deve apresentar?
O projeto deve ser apresentado tanto graficamente quanto textualmente, ou seja, além de ser apresentado na forma de maquete virtual ou analógica, planta ou mapa, deverá também possuir um relatório que defina o plano de manejo da área planejada ao longo do tempo. Esses produtos devem apresentar:
- plano de desenvolvimento (relatório);
- mapa base (aparecerá em todos os demais mapas);
- leitura da paisagem incluindo interpretação de setores;
- zonas energéticas;
- elementos em conexão (nas zonas e entre zonas); e
- análise de elementos quantificada (cada elemento).

Maquete do projeto final de planejamento, na qual foram utilizadas folhas de papelão para a construção da morfologia do terreno e linhas de barbante para a separação de zonas energéticas e cursos d’água. Foto: Arthur Nanni.

Projeto final em uma Unidade Familiar Rural no assentamento Vitória da Conquista em Fraiburgo/SC. O mapa contém setores e elementos. Após os participantes traçaram as zonas energéticas com base na posição relativa dos elementos.
Mapas que se sobreponham, seja por transparências ou por aplicativos de geoprocessamento, são muito úteis para melhor compreender a espacialização do planejamento. É necessário desenvolver pelo menos seis mapas temáticos para um melhor entendimento do planejamento:
- Mapa-base – deve conter informações como limite da área e estruturas permanentes como acessos, casas e cursos de água. É importante também situar o Norte e, se possível, expressar a escala em que foi desenhado o mapa.
- Mapa de águas – deve indicar por onde passam os fluxos e onde podem ser estocados volumes de água para sua utilização. É importante incluir as trajetórias e reservatórios, tanto os naturais quanto aqueles que modificarão esse cenário após implementado o planejamento. É importante considerar, nesse mapa, as curvas de nível: elas indicarão os melhores caminhos para se planejar o manejo das águas.
- Mapa de setores – deve incluir os setores com suas manifestações energéticas, águas (áreas drenadas e sujeitas a cheias), ventos predominantes e suas direções, insolação genérica, inclinações do terreno (declividade), curvas de nível; microclimas, risco de incêndios, ruídos, deslizamentos, etc.
- Mapa de zonas energéticas – deve incluir a distribuição das zonas energéticas de manejo da área planejada.
- Mapa de insolação – é um mapa de detalhe e deve indicar a intensidade com que o sol incide na área a ser planejada, considerando as flutuações inerentes às estações do ano (solstícios) e os elementos naturais e construídos no terreno em relação a sua posição relativa e sombreamentos associados. Procure estabelecer locais onde o sol incide por mais de 6 horas, de 3 a 6 horas e menos de 3 horas. Isso permitirá enquadrar algumas espécies vegetais em determinadas áreas, de acordo com exigências específicas de luminosidade.
- Mapa-mestre do planejamento – deve incluir os elementos necessários previstos no planejamento. A posição de cada elemento deverá considerar a análise de elementos desenvolvida no projeto final. Via de regra, o mapa-mestre de planejamento tem mais de uma versão. Isso é normal e deve ser incentivado. Na prática, o dinamismo do manejo fará com que novas versões dessa distribuição de elementos no terreno ocorram em escala real, espacial e ao longo do tempo.
Dica: Você pode usar programas como Google Earth, que possibilita trabalhar com camadas e, também, visualizar o sombreamento no terreno.

Mapa de setores. Fonte: Grupo Sol, no segundo semestre de 2015 da disciplina “Introdução à Permacultura”.

Mapa de insolação para o inverno e para o verão em uma das áreas planejadas na disciplina “Introdução à Permacultura” da UFSC. Fonte: Arthur Nanni.

Mapa de zonas energéticas. Fonte: Grupo “Sol”, no segundo semestre de 2015 da disciplina “Introdução à permacultura”.
A apresentação dos projetos finais é um momento chave no curso, pois possibilita uma intensa interação entre os participantes e uma fabulosa troca de saberes. É nesse momento que cada um dos participantes tem a oportunidade de reconhecer novas possibilidades de planejamento, bem como agregar outras linhas de manejo ao seu projeto.
Na UFSC, temos por cultura desenvolver de três a quatro projetos em diferentes grupos para a mesma área em cada edição da disciplina. Sempre sugerimos aos grupos que maximizem as discussões intragrupo e evitem saber sobre os projetos dos demais grupos. Isso gera projetos diferentes e enriquece o processo do grupo todo. No dia final do curso, as apresentações mostram isso, na prática.
Atividade no EaD
É preciso deixar claro que o projeto final será realizado na área de trabalho previamente escolhida pelo participante quando da sua inscrição no curso e a qual o aluno tem focado, durante as atividades de avaliação do curso até aqui. É importante o participante considerar o número de pessoas que serão envolvidas na execução do projeto.
Para auxiliar no projeto final, será preciso apresentar o planejamento tal como foi comentado e como é aplicado no curso presencial.
Síntese
O projeto final apresentará muitas formas de apresentação e interpretação. Erros de representação em escala, tanto para a base cartográfica quanto para os elementos, aparecerão intensamente. O que importará de fato como avaliação é o planejamento conter a lógica sistêmica de pensar da permacultura.
Na mesma linha, o relatório final apresentará algumas confusões de interpretação e de disposição dos itens a serem versados. O que reparamos é sempre uma confusão na análise de elementos, em que frequentemente os participantes conseguem muito bem definir as funções dos elementos, mas ficam devendo uma melhor compreensão das características e necessidades. Acreditamos que isso se deva à visão utilitarista da natureza que nos é inculcada desde a infância. Assim, sugere-se que se aborde essa temática sempre que possível ao longo do curso, buscando desconstruí-la para, então, construir uma lógica de pertencimento humano à natureza.
É importante lembrar que o perfil do participante de permacultura é bastante eclético. Assim, fica difícil fazer com que todos tenham uma boa compreensão de elementos do terreno, como topografia, declividade, etc. Alguns manifestarão mais afinidade pelas espécies vegetais e animais. Ainda haverá aquele grupo que mostrará afinidade com questões de planejamento social. Enfim, alunos de ciências naturais terão aptidões diferentes daqueles que provêm da área da saúde, das ciências sociais, das engenharias, etc.
Ao longo do curso, caberá ao grupo de instrutores perceber essas nuances de aptidão e, a partir delas, melhor guiar o grupo para um aprendizado mais fluido. Esse é um dos principais papéis do instrutor-âncora, que deverá estar em todos os encontros, promovendo as conexões necessárias entre as diferentes temáticas.
REFERÊNCIAS SUGERIDAS
AVIS, R.; AVIS, M.; COEN, T. Building Your Permaculture Property. New Society Publishers, 2021.
MARS, R. O design básico em permacultura. Porto Alegre: Via Sapiens, 2008.
MCKENZIE, Lachlan; LEMOS, Ego. The Tropical Permaculture Guidebook: A Gift from Timor-Leste. International Edition, 2017. v. 1. ISBN: 978-0-6481669-9-3. Disponível em: https://permatilglobal.org/. Acesso em: 04 fev 2022.
TENTH ACRE FARM. 6 Maps for the Permaculture Farm Design. Disponível em: https://www.tenthacrefarm.com/6-maps-permaculture-farm-design/. Acesso em: 14/5/2022.