Educação básica

Atualizado em

Arthur Nanni

A permacultura tem se revelado como uma importante ferramenta na Educação Ambiental de crianças e jovens, pois vai além dos atuais protocolos de ensino na temática, que via de regra não passam do senso comum, que opta por dar orientações sobre separação de lixos, reciclagem e uma pitada de consumo consciente, mas não chega a abordar questões como o não-consumo, a importância dos ciclos curtos e a valorização do local como antídoto para evitar a emergia que viaja o Brasil em carretas.

Assim, quando o tema é educação para a vida, precisamos adotar uma via de ensino da educação ambiental que aguce a visão crítica e pós-crítica de mundo das crianças e jovens. Para que isso ocorra, é  necessário que exploremos pedagogias e métodos cativantes de compartilhamento de conhecimentos, como a ecoformação e a inserção efetiva da educação ambiental como temática transversal em outras disciplinas, a luta por uma escola digna e libertária e, claro, o planejamento desses ambientes pela lógica da permacultura.

Algumas experiências com técnicas que nos auxiliam a vislumbrar um futuro mais ecologicamente saudável são apresentadas a seguir:

A escola persistente

Já imaginou uma infraestrutura de escola que nunca fica pronta? Ela existe em muitos lugares do Brasil e é sempre resultado de problemas administrativos e politicagem, que agem de forma centralizada, tornando o acesso a uma educação digna, que poderia ser fácil, em algo extremamente difícil.

A escola que trataremos a seguir, é exemplo de persistência de uma comunidade localizada no interior da Bahia.

Características

Crianças assistindo aulas em garagens de residências alugadas e, aliado a isso, a obra de uma escola iniciada em 2012 e concluída parcialmente somente em 2025. Para completar, a lógica da nucleação escolar, que joga crianças e jovens em ônibus escolares para estudar nas sedes municipais – Brasil afora – rompendo os laços dessas com seu ambiente de criação.

Necessidades

Necessidade de infraestrutura física capaz de comportar adequadamente todas as crianças, incluindo salas de aulas, banheiros, cantina, espaço de brincadeiras e prática de esportes. Mais do que isso, instrumentos pedagógicos alinhados com a vida no campo, como hortas, árvores e criação de animais, que possibilitem a manutenção da cultura local e o desejo de permanência na comunidade.

Funções

Quando a comunidade se une para atender os interesses coletivos é possível que tenhamos um ambiente escolar capaz de:

  • proporcionar uma educação emancipadora;
  • estimular o poder de auto-organização da comunidade;
  • estimular a autogestão coletiva;
  • estreitar as relações entre escola e comunidade;
  • ressignificar lugares e perspectivas de vida;
  • fomentar a cultura de permanência local.

A experiência e a técnica em detalhe

Após aguardarem por anos a entrega da infraestrutura escolar capaz de atender dignamente as crianças dos anos iniciais, a comunidade de Maniaçu, um distrito de Caetité/BA, se cansou e promoveu a auto-organização para ocupar um espaço escolar inacabado, visando seguir desenvolvendo a educação das futuras gerações em um ambiente próximo às suas moradias, “buscando fortalecer a ideia de pertencimento e valorização identitária dos sujeitos” (Silva, 2025).

Placa informativa instalada em 2012 e com prazo de execução previsto em 4 meses. Foto de Arthur Nanni.

Seguindo uma lógica formal, um professor organizou uma abaixo-assinado junto à comunidade, mas muitas pessoas não assinaram por medo de perseguição. Com isso, em 2014, a estratégia de sensibilização envolveu a realização de uma série de denúncias junto ao ministério público. Essas denúncias foram seguidas de manifestações em redes sociais, junto ao sindicato dos servidores municipais, ao Conselho Municipal de Educação (CME), intensificadas por protestos de rua pelo município de Caetité.

O processo de reivindicação por uma escola adequada teve seu ápice em 2019, quando o CME realizou uma fiscalização das instalações de ensino, incluindo garagens locadas para servirem como salas de aula, e as reprovou,  levando a notificação da prefeitura municipal para que fossem tomadas providências. Logo a seguir, a pandemia de COVID-19 paralisou o que faltava, as aulas e a merenda das crianças.

Nesse cenário de incertezas, em 2022, à gestão escolar passa a ter apoio da Secretaria Municipal de Educação (SME) e, após reunião com os pais, resolve ocupar o espaço onde estão os prédios inacabados e inicia o plantio coletivo de um sistema agroflorestal apelidado de “Quintal agroecológico”. Aos poucos a infraestrutura foi recebendo atenção de pais e professores, que passaram a viabilizar condições mínimas de atuarem em prol de uma educação mais digna.

Visão panorâmica da escola com destaque para o Quintal agroecológico. Foto de Arthur Nanni.

Ainda em 2022, a escola contava apenas com 4 salas em condições de ensino adequadas e houve a habilitação dos banheiros. Nesse ponto, a comunidade intensificou a negociação de uso da área junto à secretaria municipal de educação, por meio de incessantes reuniões que buscavam pressionar pela liberação do uso da infraestrutura parcialmente concluída e pela conclusão das obras.

Sem retorno positivo, a comunidade escolar resolveu ocupar em 2023 os prédios e iniciar as aulas nessas 4 salas, ainda sem cantina para preparo das refeições. Assim, o corpo docente  adentra o espaço de ensino-aprendizagem e segue atendendo as crianças do distrito. No segundo semestre de 2023, surge a proposta do projeto de educação em tempo integral, que iniciou com a ajuda de professores voluntários e um suporte da Secretaria Municipal de Educação, pois os índices educacionais alcançados estavam aquém dos desejados.

Apenas em 2024, 12 anos após o início das obras de infraestrutura da escola, foi que chegaram os primeiros recursos do projeto de Tempo Integral, o que permitiu a conclusão de 12 salas de aula, biblioteca e cantina, viabilizando o atendimento para 120 educandos de um total de 400 alunos regulares.

Nesse estágio, os resíduos da preparação das refeições passam a ser utilizados na alimentação das galinhas e leitoas criadas no Quintal da escola, com objetivo futuro de fortalecer as merendas e gerar adubos, que serão aplicados no sistema agroflorestal, incorporando mais biomassa aos plantios, ensinando a lógica permacultural dos ciclos curtos aos educandos.

Atualmente, o quintal agroecológico da escola segue sendo mantido com recursos oriundos de doações e conta com a atuação da comunidade no manejo. O espaço foi incorporado às práticas de ensino-aprendizagem de contraturno, tornando as aulas mais dinâmicas e integradas ao cotidiano cultural dos educandos.

A prefeitura de Caetité começa a reconhecer a importância da perspectiva da educação do campo no atendimento ao contexto comunitário de Maniaçu, como evidenciam os vídeos sobre o Espaço agroecológico da escola e o Programa Educação em Tempo Integral no Campo, promovidos pelo município, além da Revista de Educação, da SME.

Nos últimos anos, é notável o avanço do município na implementação da Educação Integral no/do Campo, uma vez que podemos observar iniciativas como a criação de turmas piloto em escolas como a Maurício Gumes…

Verificação de aplicação

Essa técnica foi visitada em agosto de 2024 no município de Caetié/BA, junto à Escola Municipal Mauricio Gumes, voltada à educação básica de crianças dos anos iniciais do distrito de Maniaçu.
Somos gratos ao seu Diretor, o professor Marcos Fernandes Silva pela acolhida e informações fornecidas.

Referências de suporte

Revista de Educação de Caetité – 1ª Edição, Caetité: fevereiro, 2025.

Silva, M., Freitas, C., Castro, N., Silva, R., & Alencar, A. (2025). Quintal agroecológico da escola municipal Maurício Gumes – Maniaçu: Um despertar para a educação em tempo integral na modalidade educação do campo. Cadernos de Agroecologia, 20(1). https://cadernos.aba-agroecologia.org.br/cadernos/article/view/10346