Arthur Nanni

Eventos extremos vinculados ao “fogo” incluem todas aquelas manifestações específicas a esse elemento natural, que podem ser preveníveis ou mitigáveis. As preveníveis incluem incêndios, radiação UV, secas prolongadas, queimadas, entre outros. Já os mitigáveis, incluem fluxos de lava de erupções vulcânicas, fluxos piroclásticos ou mesmo, a queda de um meteoro.

A permacultura usa técnicas e tecnologias de prevenção para evitar danos provocados pelas manifestações de eventos extremos menos intensos e estratégias de planejamento que buscam mitigar estragos, quando o evento já causou danos.

Aceiros

👆🏼Entenda os Contextos fitoecológicos onde a técnica é adequada

Aceiros são faixas de terreno limpas de vegetação e de outros materiais combustíveis ou, ainda, constituídos por espécies vegetais tolerantes/resistentes ao fogo, que atuam como barreiras que evitam a propagação do fogo, podendo ser naturais ou criadas especificamente para esse fim.

Na permacultura, aceiros são elementos preveníveis no que tange ao planejamento para eventos extremos e, nunca são somente uma faixa nua, pois na medida em que os mesmos são entendidos como elementos, é necessário atribuir mais funções a esses. Assim, teremos aceiros em forma de estradas, açudes, corredores em sistemas produtivos e outros.

Características

Corredores de terra nua ou com cultivos de plantas resistentes ao fogo (aceiros verdes), como suculentas, com larguras capazes de barrar a propagação do fogo em condições bioclimáticas onde há ocorrência de incêndios de origem natural, ou queimadas, provocadas por humanos onde o fogo possa se propagar facilmente em virtude do excesso de vento ou a presença de materiais combustíveis.

O comprimento de um aceiro deve circunscrever a área que se deseja proteger. Já a largura, dependerá da altura da vegetação lindeira, podendo ser desde ½ metro para campos, podendo chegar até mais de uma dezena de metros, em caso de florestas de grande porte.

Necessidades

Aceiros precisam de manutenção periódica para roçada, capina ou replantio de espécies tolerantes ao fogo, bem como para retirada de árvores ou arbustos que possam se constituir em pontes para a propagação das chamas.

É  importante que haja a colaboração entre vizinhos quando os aceiros estão em condição de limite da área planejada. Essa colaboração deve ser permanente, desde a fase de implantação seguindo durante a de manutenção.

Funções

Aceiros podem e devem ter muitas funções. Além da sua primordial, que é de barrar a propagação de incêndios, podem também servir para conduzir animais, acessar áreas com diferentes manejos no espaço planejado, servirem como trincheiras de escoamento e infiltração de águas no período das chuvas e, ainda, conformarem açudes alongados em nível para criação de peixes ou para dessedentação animal.

A técnica em detalhe

No Brasil, os domínios fitoecológicos onde mais ocorrem incêndios são na Savana, Floresta Estacional Decidual, Savana Estépica e em Áreas de Tensão Ecológica (ecótonos), entre os anteriores. Ocorrem também, mas com menor frequência, no domínio da Estepe, principalmente no verão por causas acidentais e, no inverno, de forma intencional, visando a “renovação” de pastagens. Pode ainda ocorrer nas estações secas do domínio das Florestas Estacionais.

No planejamento permacultural é interessante que os acessos às áreas a serem manejadas, sejam também aceiros. Isso irá conferir pelo menos mais uma função aos mesmos. Nas margens desses aceiros, poderão ser valorizadas as bordas, buscando-se implantar culturas que exijam a colheita por meio de trator ou veículo, como o caso de mudas arbóreas de porte, usadas na recomposição florestal ou mesmo para fins ornamentais, como palmeiras, que são geralmente demandadas para esse fim. Nesse caso as larguras dos aceiros devem ser maiores para manter o caráter preventivo do mesmo.

Outra opção para estas bordas é o plantio de plantas suculentas e de baixa inflamabilidade, que podem constituir  barreiras verdes. Um exemplo é o plantio da palma no contexto da Savana Estépica, pois seu porte baixo inibe a propagação de chamas, a mesma possui alto teor de águas em seu interior e pode ser usada na alimentação de animais.

Olhando pelo aspecto mitigador, o aceiro precisa permitir o tráfego de carros e equipamentos para acessar os focos de incêndio, buscando complementar o efeito de barramento das chamas, caso somente o aceiro não seja suficiente.

Nos limites entre zonas energéticas é recomendado o uso de aceiros quando o porte das culturas permite a propagação das chamas, como é o caso de um espaço visitado no Norte de Minas Gerais, onde o canavial da Zona 3 é, ao mesmo tempo, faixa de amortecimento de chamas que possam vir da Zona 5 (lindeira), mas pode colocar em risco plantas mais sensíveis na Zona 1.

A posição relativa do aceiro precisa considerar uma leitura da paisagem focalizada no regime de ventos, topografia e nos períodos de estiagem. Os aceiros precisam estar sempre à frente das zonas energéticas que se deseja proteger contra as chamas. No caso da zona envolver a moradia, por precaução, é importante considerar um aceiro com uma distância maior do que aquela que você considera segura e, manter todas a Zona 0 (moradia) e Zona 1 (entorno), circunscritas aos aceiros, como visto em Crato/CE.

Se o espaço planejado é lindeiro a uma rodovia nos contextos mais propícios a incêndios acidentais, como por exemplo uma bituca de cigarro arremessada, é importante a implantação de aceiros tanto antes da cerca, quanto depois da mesma, a fim de evitar danos a esta e às culturas que estarão logo após o limite, como verificado em um espaço junto a BR 230/316 no estado do Piauí.

Verificação de aplicação

Todas as aplicações foram verificadas em agosto de 2024. O aceiro entre zonas energéticas foi verificado no espaço de vida de Eustáquio e Helena no município de Congonhas do Norte/MG. Os acessos/aceiros que protegem as Zonas 0 e 1, no espaço de vida da família Gomides em Crato/CE e o aceiro ao lado da BR 230/316, no município de Picos/PI.

Referências de suporte

CBMGO. (2010). Norma operacional nº 03—Prevenção e Combate a Incêndio Florestal. https://www.bombeiros.go.gov.br/wp-content/uploads/2017/05/NO-03-Preven%C3%A7%C3%A3o-e-Combate-a-Inc%C3%AAndio-Florestal.pdf.

PMESP. (2006). Combate a incêndios florestais. Coletânea de manuais técnicos de bombeiros. https://www.bombeiros.com.br/imagens/manuais/manual-04.pdf.

Sener, H. (2024). Firebreaks: A Detailed Look. Permalogica. https://www.permalogica.com/post/firebreaks-a-detailed-look.

Santa Monica Mountains National Recreation Area (2025). Sustainable Defensible Space. https://defensiblespace.org/.

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