Permacultura na Escola pública: uma experiência em Ecoformação

Permaculture in public School: an experience in Ecoformation

VASQUES, Marjorie1;

PUKALL, Jeane2

Submetido em 31mai2025. Aceito em 23set2025.
Revisão por Leila Paiter e Maíra Figueiredo Goulart

https://doi.org/10.5281/zenodo.17617302

Resumo: A pesquisa buscou congruências pragmáticas e metodológicas entre Permacultura e Ecoformação. O objetivo foi identificar fatores na escola que promovam projetos de Permacultura aliados à Ecoformação, e despertam uma educação a partir da vida e para a vida. A pesquisa aconteceu na Escola Reunida Professora Targina Boaventura da Costa, Secretaria Municipal de Paulo Lopes, localizada na borda de relevantes áreas de proteção ambiental em Santa Catarina e foi baseada na experiência de educadoras e estudantes envolvendo a criatividade, a colaboração, a capacidade de resiliência, a experiência de interconexão e a noção de interdependência. As práticas propostas sensibilizaram e transformaram pessoas e espaços.
Palavras-chave: Ecoformação. Permacultura. Projeto Criativo Ecoformador

Abstract: The research sought pragmatic and methodological congruences between Permaculture and Ecoformation. The objective was to identify factors in the school that promote Permaculture projects combined with Ecoformation, and awaken an education from life and for life. The research took place at the Escola Reunida Professora Targina Boaventura da Costa, in Paulo Lopes, located on the edge of important environmental protection areas in Santa Catarina and was based on the experience of educators and students involving creativity, collaboration, resilience, the experience of interconnection and the notion of interdependence. The proposal provided an opportunity to raise awareness and transform people and spaces.
Keywords: Ecoformation, Permaculture, Creative Ecoformative Project

Introdução

A escola exerce muitas funções no cotidiano das comunidades e culturas do mundo todo. Entre elas, um lugar seguro para que crianças, jovens e demais participantes possam, em coletivo, conviver, conhecer, exercitar direitos e deveres. Além disso, é lugar de ampliar visões a partir da diversidade na relação consigo, com o outro e com o ambiente (Brasil, 2018). A articulação das relações de aprendizagem na escola é complexa e depende de uma rede de profissionais multifacetados, capazes de exercer funções pedagógicas e administrativas concomitantemente. Assim, a escola tem um importante papel na transformação das pessoas, pois é um campo aberto ao protagonismo e à criatividade.

Na perspectiva da ecoformação, interagindo com o meio onde vivem, os estudantes se constituem e também constituem conhecimentos. Nesse sentido, a Ecoformação, aborda o envolvimento de estudantes e mediadores educacionais por meio de Projetos Criativos Ecoformadores (PCE). Torre & Zwierewicz (2009) afirmam que o trabalho com projetos ecoformadores é uma proposta de ensino baseada nos interesses dos estudantes e educadores. Sendo assim, a contextualização é fundamental para elencar o ponto de partida de interação entre teoria e prática. Elaborar o painel de interesses para apresentar os ambientes ecoformadores; realizar a leitura da natureza para entender onde vivemos; percorrer os caminhos da escola para expandir horizontes; compreender onde estamos; e finalmente, construir o mapa da escola para pertencer; são exemplos de epítome, o ponto de partida do PCE.

O trabalho por meio do PCE oportuniza a ampliação da visão crítica da realidade, já que em todos os espaços da vida cotidiana encontram-se desafios a serem superados. Para começar, é importante “observar e interagir” (Holmgren, 2013), ou seja, fazer um bom diagnóstico sobre quais ações podem ser realizadas com o objetivo de auxiliar na interação sistêmica, a partir das necessidades do eu, do outro e do ambiente.

Os Projetos Criativos Ecoformadores têm como pressupostos teóricos o pensamento complexo, a transdisciplinaridade e a ecoformação (Torre & Zwierewicz, 2009). Desse modo a criatividade é uma das capacidades requisitadas para que, a partir do epítome, vários conteúdos sejam consultados pelos estudantes na construção dos trabalhos. É importante que o planejamento das metas esteja vinculado às perguntas provenientes do interesse dos estudantes, e que essas sejam condutoras na solução das dificuldades por eles enfrentadas no decorrer do processo.

Dessa forma, a complexidade pode ser entendida, de forma simplificada, como o pensamento que integra as partes que compõem o todo (Morin, Edgar, 2005) Assim, ao considerar o contexto ambiental e cultural no qual está inserida a escola, surgem inúmeras oportunidades para sensibilizar, provocar e conduzir. Portanto, o sentimento de prazer pode ser estimulado. Dessa forma, a aplicação de projetos contextualizados ao meio natural e às necessidades escolares serve ao exercício dos princípios da ecoformação que são: autoformação, heteroformação e ecoformação (Zwierewicz et al., 2019).

No Glossário de Terminologia Curricular apresentado pela (UNESCO, 2016), p.9) o termo abordagem transdisciplinar é definido como “Abordagem à integração curricular que dissolve os limites entre as disciplinas convencionais e organiza o ensino e a aprendizagem em torno da construção do significado no contexto de temas ou problemas do mundo real”. Portanto, uma educação com abordagem transdisciplinar procura oportunizar uma aprendizagem relacionada aos problemas do mundo atual, enfatizando o contexto e buscando por processos mais dinâmicos e integradores. Desse modo, as disciplinas se apresentam conectadas, oportunizando uma educação além do ensino disciplinar e fragmentado.

A ecoformação considera a transdisciplinaridade como ponto importante na formação de estudantes criativos e autônomos, pois “é uma maneira sintética, integradora e sustentável de entender a ação formativa, sempre em relação ao sujeito, à sociedade e à natureza.” (Torre et al., 2008, p. 21).

Já a Permacultura é a cultura de permanência humana no habitat, como traz a Rede NEPerma Brasil (2022), que apresenta uma perspectiva ecológica a partir do planejamento pautado em princípios éticos onde se busca elaborar sistemas energeticamente sustentáveis e eficientes por meio de conexões funcionais. Dessa forma, dentro da paisagem, para cada elemento inserido no sistema planejado se faz uma análise quanto suas características, necessidades e funções para entender a dinâmica e ligação com outros elementos.

Fazendo um paralelo com a Ecoformação se observa, também na Permacultura, uma abordagem ecossistêmica que tem como ponto de partida a contextualização. Além disso, a Permacultura igualmente apresenta três premissas éticas do cuidado da Terra, cuidado das pessoas e a partilha justa, bem como doze princípios de planejamento (Holmgren, 2013). Apesar da Permacultura ter sido assim nomeada e sistematizada por Mollison e Holmgren, sabe-se que ela reúne princípios e práticas de conhecimento ancestral. Desse modo, no Curso de Planejamento em Permacultura (CPP) se utiliza métodos de abordagem diversos, a partir do currículo voltado à alfabetização ecológica por meio de três estágios: [re]conexão com a natureza; manejo da natureza; humanos na paisagem (Nanni et al., 2019).

Sendo assim, realizamos a pesquisa, baseada na relação entre Permacultura e Ecoformação no espaço escolar, no que tange aos princípios éticos e às congruências epistemológicas de complexidade e transdisciplinaridade. A contextualização, como um caminho para superar os desafios de ensino e aprendizagem na elaboração de espaços relacionais entre o eu, o outro e o ambiente e apoiados em conceitos e conteúdos que são trazidos por ambos métodos de abordagem.

Dessa forma, buscamos entender como o Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola pesquisada, justifica e conduz o processo experimentado entre seus participantes na educação básica e pública. Para tal, o objetivo geral foi identificar fatores na Escola que promovem projetos de Permacultura aliados à Ecoformação, e despertem uma educação a partir da vida e para a vida. Os objetivos específicos foram (1) elaborar um diagnóstico sobre o conhecimento que os professores da Escola Reunida Professora Targina Boaventura da Costa tem do PPP, no que tange aos aspectos metodológicos, bem como ao conhecimento da Certificação de Escola Criativa (Vasques, 2024); e (2) Identificar no Projeto Político Pedagógico (PPP) da Escola Reunida Professora Targina Boaventura da Costa, elementos que evidenciem uma educação em Permacultura e Ecoformação.

A questão condutora da pesquisa envolveu o seguinte problema: Como a visão ecossistêmica compartilhada entre Permacultura e Ecoformação pode contribuir para uma educação significativa relacionada com as necessidades da vida?

Escola ecoformadora e criativa

A Escola Reunida Professora Targina Boaventura da Costa situa-se na área rual do município de Paulo Lopes–SC, como mostra a Figura 1. É mantida pela Secretaria Municipal de Educação de Paulo Lopes, então trata-se de uma Escola de educação básica municipal. A Escola Targina é localizada pelas coordenadas geográficas com latitude 27°57’06“S e longitude 48°38’42”W e, está na borda da Unidade de Conservação do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, especificamente entre a Lagoa do Coração e a Área de Preservação Ambiental (APA) da Baleia Franca. Configura uma área relevante de amortecimento de águas e biodiversidade da flora e fauna, com vegetação da floresta ombrófila densa, mangues e restinga (FATMA, 2009).


Figura 1: Localização da escola no município de Paulo Lopes. Fonte: OpenStreetMap.

A instituição atende atualmente 168 estudantes, matriculados na Educação Básica Anos Iniciais, e conta com 22 docentes, 3 gestoras e 3 auxiliares. Além disso, a Escola nutre relação com um grupo de pessoas comprometidas com a preservação do meio ambiente, que em grupo têm colaborado na construção dos espaços relacionais de aprendizagem e na sua manutenção. Com área aproximada de 7.000 m², o espaço da Escola oferece desafios de planejamento conforme a Figura 2.


Figura 2: Contexto – área da escola, comunidade e seu entorno.

Ao mesmo tempo que há possibilidade da ocupação desse território por meio de iniciativas inovadoras e sustentáveis, é preciso colaborar para a apropriação dos conteúdos curriculares e favorecer uma formação comprometida com o bem-estar individual, social e ambiental. Participaram da pesquisa, mais especificamente no fornecimento de informações por meio de um questionário, dezessete (17) profissionais, entre eles professores e equipe gestora, no ano de 2024.

No período de 2017 a 2021, a Secretaria Municipal de Educação de Paulo Lopes aderiu ao Programa de Formação-Ação em Escolas Criativas. A elaboração dos projetos, nas escolas da rede municipal de educação, teve como pensamento organizador a promoção de escolas criativas para uma cidade sustentável (Zwierewicz et al., 2019). Desse modo, a metodologia de Projeto Criativo Ecoformador (PCE), passou a ser implementada na Rede Municipal, oportunizando a elaboração de trabalhos por projetos a partir da visão ecossistêmica. As práticas sustentáveis passaram a ser valorizadas como meio de sensibilização e forma de buscar o desenvolvimento de competências e habilidades curriculares previstas pela Base Nacional Comum Curricular (Brasil, 2018).

Até 2019, os espaços relacionais ou ambientes ecoformadores (horta pedagógica, composteira, minhocário, pomar, casa das abelhas, sabão de ervas boa’ventura, círculo de bananeiras, árvore palavreira) foram sendo criados e construídos pautados na curiosidade sobre como solucionar problemas da própria ocupação e, também, na criatividade sobre como transformar por meio do protagonismo dos estudantes e da participação das famílias e comunidade.

Em 2020, iniciamos o ano letivo entre docentes e gestores da rede municipal, com a Ecoformação de professores, sob orientação da Professora Dra. Marlene Zwierewicz. Estruturamos o objetivo principal e metas dando continuidade aos PCE nas escolas. Porém, em meados de março de 2020 ocorreu o evento extremo da pandemia por COVID. Assim, houve um período de pausa para reestruturação de um novo modo de interação entre Escola, famílias e comunidade na tentativa de manter o processo de ensino e aprendizagem. Frente ao desafio da necessária reclusão, foi preciso interagir por meio de apostilas e encontros virtuais, fazendo com que objetivo e metas traçadas para a continuidade do PCE ficassem em segundo plano. Em todas as unidades escolares os PCE perderam força e na maioria delas, não foram retomados.

No início do ciclo seguinte, em 2021, aconteceu a última Ecoformação de professores, com a professora Marlene Zwierewicz pela Secretaria Municipal de Educação (SME). A Escola Targina conseguiu retomar o PCE por conta disso e também da base sólida construída anteriormente, em função da produção de legitimação teórica, da atuação de professora articuladora e pela comprovação do protagonismo dos estudantes, frente ao envolvimento com os ambientes ecoformadores. Foi um período de reformulações e superação das dificuldades pelo tempo longe do ambiente escolar. A conexão com os preceitos metodológicos precisou ser refeita e os ambientes ecoformadores ressignificados.

Através desse esforço em dezembro de 2022, no XI Fórum Internacional de Inovação e Criatividade (XI INCREA), a Escola recebeu o Certificado de Escola Criativa pela Rede Internacional de Escolas Criativas-RIEC com o reconhecimento de Marlene Zwierewicz, membro da RIEC, que acompanhou a pesquisa utilizando como instrumento o VADECRIE (Instrumento para valorizar o desenvolvimento criativo das instituições de ensino) e, que durante vários anos coordenou o processo de formação continuada na Rede Municipal de Ensino de Paulo Lopes, coletando evidências da metamorfose, identificando-a como Instituição Criativa.

Por meio da relação com a RIEC, a escola participou de inúmeros eventos como seminários onde pode fazer trocas de saberes e experiências com outras instituições e seus projetos. A interação com educadores e educadoras das escolas de Santa Catarina, os membros da RIEC, em especial o professor Saturnino de La Torre e a orientação da professora Marlene Zwierewcz, foram condições imprescindíveis no pertencimento como Rede, em um movimento contínuo de alinhamento de ideias, renovação, motivação e inspiração.

Permacultura e ecoformação na escola

Ao promover um diálogo entre as possíveis formas de ocupar a escola de educação básica, ressaltar as relações existentes entre a Permacultura e a Ecoformação pode auxiliar no fortalecimento de práticas metodológicas nas quais estudantes sejam os protagonistas. Pode auxiliar, também, na busca do entendimento sobre como princípios, conceitos e conteúdos da Permacultura podem alicerçar práticas contextualizadas promovendo, conjuntamente à Ecoformação e uma educação da vida e para a vida, pois encontramos similaridades pragmáticas e sistemáticas entre ambas.

Na prática pedagógica na escola, sob orientação e acompanhamento de professores, o brincar na natureza oferece um campo real de observação, interação, pesquisa e processamento de textos de muitos tipos. Esse processo potencializa uma experiência sensível e cognitiva na aprendizagem, promovendo o pensar científico e a “transformação da cultura científica em consciência pessoal” (Rocha et al., 2024). Na educação é preciso retomar a relação intrínseca entre o eu, o outro e o ambiente, junto à compreensão de unidade e interdependência.

Por meio da obra “Ensinando Permacultura”, organizada por (Nanni et al., 2019), conhecemos as formas de ensinar permacultura, com o currículo baseado na proposta de Bill Mollison. Assim como na Ecoformação, todas as propostas em ensino de Permacultura apresentadas podem facilmente permear um Projeto Criativo Ecoformador. Pois, o conjunto de princípios éticos e conceitos epistemológicos que as estruturam são similares. O mapa mental da Figura 3 apresenta as relações causadas pelo ensino de permacultura na educação básica.


Figura 3: Relações no ensino de Permacultura na Escola (Vasques, 2024).

A abordagem pelo contexto, conceito e conteúdo, na prática, transdisciplinar e criativa, caracteriza a metodologia como ativa. E justamente por oportunizar o pertencimento, o protagonismo, a reconexão com o ambiente imbuída de princípios, acaba por buscar uma educação a partir da vida e para a vida. Assim como a Ecoformação, a Permacultura também busca alcançar a formação integral das pessoas por meio de uma pedagogia que parte de três princípios éticos que são: cuidar da Terra, cuidar das pessoas e partilha justa (Holmgren, 2013).

Apesar da Permacultura ter sido sistematizada na década de 1970 por Bill Mollison com o intuito de promover uma alternativa ecológica para a ocupação humana, preocupada com os cultivos e demandas energéticas, evidencia a importância de inúmeras outras questões fundamentais de permanência na paisagem. O cultivo é uma das disciplinas fundamentais na Permacultura, pois trata da subsistência e soberania alimentar de comunidades. No entanto, não é vista como isolada. A horta infere um pensamento sistêmico que vai desde o planejamento, baseado em princípios, passa pela setorização e zoneamento e vai até um conjunto de técnicas para a sua implementação.

Na Escola Targina houve a aplicação prática sob a perspectiva da Permacultura e Ecoformação com a construção de uma horta pedagógica que contou com pesquisa e articulação feita entre instituições como Rede Ecovida de agroecologia, Centro de Estudos e Promoção da Agricultura de Grupo (CEPAGRO), Prefeitura Municipal de Paulo Lopes, etc.

Mantida por meio dos mutirões familiares e voluntariado, a horta tornou-se um ambiente ecoformador, na medida em que estudantes puderam interagir para criar, construindo uma aprendizagem mais significativa orientada por princípios. Assim, ao mesmo tempo que são solicitados aos estudantes, leituras, produção de textos e pinturas com tintas naturais, também são promovidos o contato com a terra e a oportunidade de vivenciar entre colegas, amigos e famílias.

Buscando complexificar e diversificar o sistema e as oportunidades de fruição e pesquisa, foi implementada, junto à horta, uma linha de bananeiras, com o objetivo de proteger do vento, sombrear, fazer solo, reter água e obter rendimentos para compartilhar. Essas conexões, entre elementos e suas funções, como a horta (pedagógica, produção de alimentos, inspiração) e as bananeiras (barreira, biomassa, produção de frutas) são analisadas e utilizadas como preceitos no desenho de planejamento em permacultura. A Figura 4 mostra o desenho de zoneamento energético da escola a partir da zona 0, onde ficam concentradas as interações humanas. Sob a perspectiva da eficiência energética do sistema, o desenho se expande para a zona 1 e assim por diante.

A Escola Targina tem espaço privilegiado pelo contexto comunitário e ambiental, especialmente pelo amplo jardim, que oportuniza a construção de ambientes ecoformadores baseados nos princípios de planejamento da Permacultura. Além do território oportuno, a Escola conta com o PPP, que contém informações e diretrizes, onde encontramos as orientações pedagógicas voltadas para o “plano de ação que estimule o educando a ser ativo, reflexivo e dinâmico” (Paulo Lopes, 2022, p. 36). Com o objetivo de alcançar todos os estudantes, o PPP enumera métodos pedagógicos, entre eles os “projetos escolares e temas geradores: Projeto Ecoformador (PCE)” (Paulo Lopes, 2022, p. 37).


Figura 4: Desenho de planejamento: zoneamento e ambientes ecoformadores (Vasques, 2024).

No PPP, ainda no capítulo que trata da organização do ensino, especificamente sobre o PCE, em coordenadas temporais, notamos o planejamento pautado nas diretrizes do Currículo Base da Educação Infantil e do Ensino Fundamental do Território Catarinense (2019). Versa sobre os princípios da educação ambiental, que por sua vez funciona como tema integrador, e cita, inclusive, a possibilidade da permacultura contribuir com os componentes curriculares (Santa Catarina, 2019, p. 38). Desse modo, Paulo Lopes (2022, p. 41) busca justificar o uso do PCE como metodologia inovadora na formação de sociedades sustentáveis (Santa Catarina, 2019, p. 33) e, na conquista do reconhecimento de Escola Criativa pela Rede Internacional de Escolas Criativas (RIEC).

Notamos que no ato da construção do PPP, em 2022, existia a intenção e um plano de ação para que todos os professores adotassem o PCE. Visto a flexibilidade de adaptação ao contexto da escola e aos conceitos de criatividade e transdisciplinaridade, a resiliência e continuidade do PCE, foram requisitos fundamentais para a conquista do Certificado. Os critérios pelos quais a Escola foi certificada, reúnem ações executadas no período entre 2017 e 2022. A última atualização do PPP da Escola foi realizada justamente em 2022 e, por esse motivo, não traz a narrativa deste feito. No entanto, a descrição dos critérios, no próprio certificado, aponta o caminho para a continuidade do trabalho, também justificado pelo PPP.

Todavia, ambos os documentos conferem aos professores e equipe gestora da Escola responsabilidades quanto às práticas veiculadas por meio de planejamentos e atividades. Conforme aponta o certificado, “o compromisso assumido de se transformar enquanto também colabora para a transformação do seu entorno. Seu potencial de metamorfose criativa e polinizadora fez que em sua trajetória a instituição passasse a se destacar pelo planejamento transdisciplinar e por práticas pedagógicas ecoformadoras” (Vasques, 2024). Desse modo fica evidente que o certificado apresenta orientações sobre quais procedimentos e ações podem contribuir para a realização de práticas inovadoras, apontando inclusive as técnicas de permacultura aplicadas na escola.

Na Escola Targina os PCE foram executados a partir do diagnóstico sobre as necessidades da escola e dos estudantes, tendo em vista as potencialidades do ambiente e os saberes da comunidade. Conforme o desenho do zoneamento apresentado na figura 4 foram dispostas as técnicas em suas respectivas zonas.

Durante o PCE Recicle Plante e Crie: é uma Boaventura, realizado em 2017, nas zonas 0 e 1 foi desenvolvido o PCE Sabão de Ervas Boaventura. Houve a sensibilização ambiental coletiva, causando mudanças de hábitos dos participantes enquanto formava multiplicadores de informação sobre o reaproveitamento de materiais, tendo a presença da comunidade de modo ativo.

No PCE Sementes da Liberdade: regar para colher amor, realizado em 2018, na zona 1 foi instalada a composteira termofílica e o círculo de bananeiras para tratamento das águas cinzas. Na zona 2, a revitalização da horta pedagógica e do pomar, sendo a zona 5 resguardada como área de preservação. Nesse PCE foi adotado o regime de mutirões com a participação direta da comunidade que contribuiu nas respectivas zonas 0, 1 e 2.

O PCE Integrar Saberes no Jardim da Vida, realizado em 2019 alcançou número bastante relevante de ações e participantes. Na zona 1 houve a instalação do minhocário, do observatório de pássaros, do galinheiro e da árvore palavreira com bancos e uma bancada na sombra da árvore figueira como espaço de leitura e experiências. Na zona 3 foi instalada uma caixa de abelhas-sem-ferrão mirim-guaçu. Na zona 4 foi criada a célula de biomassa. Todos os ambientes ecoformadores foram organizados pela equipe escolar e os estudantes, tendo a participação da comunidade escolar por meio dos seis mutirões realizados no decorrer do ciclo.

Já no PCE Saber Aprender para Bem Viver, realizado entre 2011 e 2022, nas zonas 1, 2, 3, 4 e 5 houve a revitalização dos espaços por meio da repetição constante no manejo com a natureza, por meio do trabalho com estudantes e voluntários. Houve pausa nos mutirões devido ao isolamento da pandemia de COVID.

O PCE Reciclar, Plantar e Aprender é uma Boaventura realizado em 2023, teve a construção da casa jardineira para o depósito de materiais de manejo dos espaços com acesso aos estudantes na zona 2. Enquanto na zona 3, o galinheiro passou a funcionar como o hotel dos animais. Já a zona 5 sofreu intervenção humana, se transfigurando em área de recuperação.

Por fim, no PCE Leituras no Jardim Boaventura realizado em 2024, houve a continuidade das ações promovidas anteriormente, com a interação dos estudantes por meio da elaboração do Jornal Escolar Folha Boaventura permeando as zonas 0, 1, 2 e 3, a implantação dos círculos de ervas e jardim de girassóis na zona 1 (Figura 5).

Desse modo, as interações nas zonas aconteceram por meio dos preceitos da permacultura, incluindo as conexões funcionais onde os elementos se conectaram por meio de suas funções na paisagem. Sempre estiveram presentes as éticas do cuidar da Terra, das pessoas e do futuro, além dos doze princípios de planejamento (Holmgren, 2013), passando pela aplicação do pensamento sistêmico, que entende que tudo é interdependente e, pela presença dos princípios da educação ambiental pela promoção de comportamentos sustentáveis (Santa Catarina, 2019).

Ao organizar os ambientes ecoformadores por meio do zoneamento proposto pela permacultura, percebemos que foi considerado o contexto social e ambiental no qual a escola está inserida. Enquanto as atividades foram conectadas de modo transdisciplinar, acessando o currículo, foi oportunizado aos estudantes o protagonismo, o pertencimento e a experiência de convívio saudável através dos conceitos e conteúdos.

No desenvolvimento dos PCE foi possível observar alguns princípios de planejamento da permacultura. A participação ativa dos estudantes em todas as fases trouxe o princípio “use e valorize a diversidade”; já o envolvimento das demais turmas da escola, alicerçou no princípio “observe e interaja”; a participação de professores regentes, equipe gestora e auxiliares gerais, destaca o “integrar ao invés de segregar”; a participação das famílias e comunidade na gestão do óleo usado e banca do sabão no PCE Sabão de Ervas Boa’ventura, traz o “use e valorize os serviços e recursos renováveis”, “pratique a autorregulação e aceite retornos”, “obtenha rendimento”; o desenvolvimento da criatividade e do pensamento ecossistêmico trazem o “use soluções pequenas e lentas”; a criação, revitalização e manutenção dos ambientes ecoformadores por meio dos mutirões o “não produza desperdícios”, “use e valorize os serviços e recursos renováveis” e, a “área de preservação x área de regeneração” trabalhou o “seja criativo e responda às mudanças”.

Dentre tantos PCE, o Sabão de Ervas Boaventura (Figura 6) se destaca por permear todos os outros e por ser o pioneiro. Realizado na Escola Targina de 2017 até 2024, promoveu o reaproveitamento do óleo usado de cozinha advindo da comunidade (Figura 7). A prática foi identificada como um interesse das pessoas e durante o desenvolvimento do projeto, com o uso do sabão na Escola, os estudantes questionaram sobre a destinação das águas da cozinha. Por isso, projetaram e executaram o círculo de bananeiras para o tratamento das águas cinzas (Figura 8). Os estudantes realizaram muitas experiências, integrando saberes e tocando em questões emergentes locais, regionais e mundiais, promovendo ações práticas descentralizadas, sustentáveis e de fácil aplicabilidade.


Figura 5: Construção do círculo de ervas e leitura da bandeira do PCE Sabão de Ervas Boa’ventura.

Figura 6: Produção do sabão, registro livre das etapas no caderno e rotulagem, embalagem do sabão.

Figura 7: Pesagem para informação no produto final e vendas na banca do sabão para a comunidade.

Figura 8: Construção do círculo de bananeiras e a banca do sabão na árvore palavreira durante o mutirão na escola.

Considerações finais

A pesquisa identificou muitos elementos que promovem projetos de Permacultura aliados à Ecoformação na Escola Targina. Percebemos a Escola como um rico campo de interações sociais e lugar de experiências coletivas práticas, para viver e entender a vida, refletir sobre ela e ampliar as perspectivas sobre a realidade.

Diagnosticamos que os professores da Escola Targina possuem um conhecimento razoável do Projeto Político Pedagógico, no que tange à compreensão metodológica, e o conhecimento do Certificado de Escola Criativa (Vasques, 2024). Já que os PCE acontecem com constância, consideramos que o número médio de professores que convergem atuações, acabam por promover a continuidade dos projetos. Também pudemos identificar no PPP, elementos que evidenciam uma educação em Permacultura e Ecoformação por meio da metodologia dos Projetos Criativos Ecoformadores.

Verificamos que a escola apresentou excelentes metodologias sistematizadas, oferecendo facilidades na aplicação dos planejamentos pelos professores e, a articulação desenvolvida de uma professora efetiva, foi um diferencial no desenvolvimento dos PCE. Junto a isso, o conhecimento de parte dos professores da escola dos referenciais teóricos, bem como do PPP, trouxe mais significado à prática pedagógica.

Esse relato de experiência apresentou mais do que técnicas, demonstrou “soluções pequenas e lentas”, que se tornam grandes em tempo e espaço pela repetição firme e constante. Nisso, os princípios éticos compartilhados entre Permacultura e Ecoformação colocados em prática por meio dos PCE, conferiram uma maior resiliência dos participantes e ações.

Motivar pessoas para que mais escolas de educação básica sejam criativas e vejam na transdisciplinaridade, proposta pela Permacultura e Ecoformação, um jeito de transformar e gerar impactos positivos na vida de todos, é o propósito deste relato. Tudo está interconectado, tudo é interdependente.

Na educação é preciso resgatar conceitos que fortalecem as práticas que evidenciam a intenção de interagir com o meio e educar ecologicamente por meio de ações sustentáveis e regenerativas. Conhecimentos que podem ser transferidos para os demais setores do cotidiano, e nesse sentido a Permacultura e a Ecoformação têm muito a oferecer.

Referências

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Contribuições

Marjorie Vasques realizou a pesquisa e relatou a experiência. Jeane Pitz Pukall orientou a pesquisa e o relato de experiência.

1 – Secretaria Municipal de Educação de Paulo Lopes, marjorieavasques@gmail.com

2 – Rede Internacional de Escolas Criativas, jeane.pukall@gmail.com