Aterrar na permacultura em favor de outros mundos possíveis na era do antropoceno

Grounding in Permaculture for other possible worlds in the Anthropocene Age

SANTOS, Francisca Fanka Pereira dos1

Submetido em 26jun2024. Aceito em 11dez2024.

Revisão por Letícia Magalhães Fernandes e Priscila Silva de FIgueiredo

DOI: https://doi.org/10.5281/zenodo.14751274 

Resumo

Este artigo tem como objetivo apresentar uma leitura da permacultura a partir dos estudos críticos da Virada Ontológica da Antropologia e Filosofia da Ciência na Era do Antropoceno. Parte da hipótese de ficção política apresentada por Bruno Latour e da afirmação de um Novo Regime Climático, que avançou de um contexto de “crise” ambiental de fins do século XX, para o de “mutações”, contemporaneamente. Esta realidade, entretanto, apesar de todas as evidências e dados sobre o aquecimento global e suas consequências, vem sendo negada por uma elite neoliberal – desde a década de 1980 – resultando em um movimento internacional negacionista do clima, entre outros. É nessa conjuntura de passagem da “crise” às “mutações” ocorridas no social, na política e na biosfera da Terra, que a permacultura aparece como uma grande “ideia para adiar o fim do mundo”, na expressão de Ailton Krenak, ou como resistência para a Grande Virada, conforme Joanna Macy e Chris Johnstone, exigindo que entremos em ação e atualizemos nossa forma de pensar, agir e organizar nessa nova conjuntura de catástrofes e ruínas.

Palavras-chave: permacultura; antropoceno; novo regime climático.

Abstract

This article aims to present an interpretation of Permaculture from the perspective of critical studies within the ontological turn in Anthropology and Philosophy of Science, in the Anthropocene Age. This article is based on the hypothesis of political fiction presented by Bruno Latour and the assertion of a New Climatic Regime that has evolved from an “environmental crisis” context, characteristic of the late 20th century, to one of “mutations” in the Contemporary Age. Despite overwhelming evidence and data on global warming and its consequences, this reality has been systematically denied by a neoliberal elite —since the 80s— leading to an international climate denialist movement, among other challenges. It is within this context —of the shift from “crisis” to “mutations” occurring in the social, political, and biospheric dimensions of the Earth —that Permaculture emerges as a significant “idea to postpone the end of the world,” as expressed by Ailton Krenak, or as a form of resistance to the “Great Turning” according to Macy and Johnstone – demanding that we must take action and update our ways of thinking, acting, and composing in this new context of catastrophes and ruins.

Keywords: permaculture; anthropocene age; new climatic regime.

Da crise à mutação

A década de 1970 é uma época paradigmática. Ela revela e nos informa que algo de novo estava se bulindo, se contorcendo, se esgarçando na cena planetária, permitindo a emergência de importantes movimentos de protestos e rupturas contra um modo de vida ocidental, marcado por uma modernidade industrial, baseada em combustíveis fósseis, exploração, consumo e degeneração de ecossistemas. Contra uma crise que era tanto ambiental como cultural, mundos outros emergiram, com destaque para as lutas feministas em uma segunda grande onda de mobilizações, denunciando a violência contra as mulheres e a natureza, além da ampliação das lutas antirracistas pelos direitos civis, nos EUA, já lideradas por Luther King, Rosa Parks, Malcon X e os Panteras Negras. Inicia-se ali, o que hoje é o movimento LGBTQIAPN+2 a partir dos conflitos entre policiais, gays e lésbicas, em 28 de junho de 1969, que passou a ser historicamente reconhecida como o dia do orgulho relacionada à sigla acima citada. Podemos ainda falar da presença transgressora de uma geração punk, bem como manifestações contra a guerra no Vietnã (1975) e outras favoráveis às revoluções, como a dos cravos em Portugal (1974) e a iraniana (1979), entre outros acontecimentos. A lista de movimentos de resistência é enorme.

Do lado ambiental, surgem os ativismos ecológicos, em que se destacam a criação do Greenpeace, em 1971; o primeiro Partido Verde, na Austrália (1972) e Inglaterra; a pauta antinuclear, o movimento Chipko na Índia, liderado por mulheres em favor das florestas, assim como a luta em defesa do lago Pedder e do rio Franklin, na Austrália, que foi um dos movimentos ambientais de maior relevância internacional. É desse período, também, o início da criação de Tamera (1978), um biótopo de cura e paz da terra, atualmente localizado em Portugal, bem como o surgimento de importantes reflexões e publicações como o livro Libertação Animal (Singer, 1990), que foi um marco político nesse período, sobretudo com a Declaração Universal dos Direitos dos Animais, no final dos anos setenta (UNESCO, 1978). Esta década revela ainda, o que todos já pressupunham, mas que até então não havia sido tecnicamente mensurado: o relatório produzido pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts – MIT, publicado em 1972 pela cientista Donella Meadows3, que expõe a limitação do modelo de gestão do capitalismo e o crescimento econômico sem limites.

É nessa época revolucionária de importantes retomadas – como os movimentos citados e ainda, os da agroecologia, agricultura natural e biodinâmica, que a permacultura nasce, a partir das propostas de Bill Mollison e David Holmgren. Ela emerge “inicalmente como uma alternativa à agricultura insustentável e impermanente da Revolução Verde” (Ferreira-Neto, 2018), e em seguida, se torna uma ciência de planejamento de assentamentos humanos que permite recuperar ecossistemas alterados em sua biogeoquímica pelas ações antrópicas. A permacultura, segundo (Holmgren, 2013, p. 30), aparece como “uma das alternativas ambientais que surgiram a partir da primeira grande onda da moderna conscientização ambiental”, logo após os dados sobre os limites ao crescimento econômico, feitos a pedido do Clube de Roma, e a crise do petróleo, respectivamente em 1972 e 1975.

Nas últimas cinco décadas, conforme podemos verificar em sua historiografia, a permacultura – essa ciência sistêmica para permanência humana e não humana na Terra – vem sendo praticada mundialmente, sistematizando e disseminando um conjunto de tecnologias nas áreas de saneamento básico, recursos hídricos, energéticos, sistemas alimentares, entre outros. Do ponto de vista de sua organização, promoveu encontros nacionais e internacionais, capacitações e cursos de design em permacultura (PDC do inglês), consolidando-se como uma importante ferramenta de recuperação de ecossistemas. Esta ferramenta chega no século XXI como um destacado aporte prático e teórico para contribuir com o enfrentamento à atual crise climática, sobretudo porque constatamos, quase de forma desesperada, que os estudos, o alerta e as denúncias realizadas até hoje para mitigar o avanço das catástrofes ambientais e culturais, não foram suficientemente levados em consideração, revelando o quanto o capitalismo, filho da colonização e neto do patriarcado, continua devastando, dizimando e colonizando impiedosamente o planeta.

Cinco décadas após o surgimento da permacultura, não estamos mais na “crise” descrita da década de 1970, mas sim, dramaticamente, no centro de uma “mutação” (Latour, 2020, p. 23) planetária, causada pelo aceleramento radical do crescimento econômico sem limites. Podemos exemplificar as bases dessa mutação, com dados que explicam essa tragédia. Segundo (Figueiró, 2020, p. 19), registra-se no cenário planetário de “cem a mil vezes mais perda de espécies por unidade de tempo do que a dinâmica material de extinção ao longo das eras geológicas”, o que sugere Ellis e Ramankutty apud Figueiró (2020, p. 18) “propor a substituição do termo biomas por ‘antromas’, devido ao alto nível de destruição ambiental pela interferência humana”. Esses e outros dados das mutações, tais como a degeneração dos biomas, as pandemias, o aumento da concentração de CO2 na atmosfera, entre outros riscos ambientais, nos conduzem, segundo (Macy & Johnstone, 2020), a um “grande desmoronamento” que é, entre outros, o esgotamento de sistemas naturais, ou segundo a cosmologia Yanomami, “a queda do céu” (Kopenawa & Albert, 2015). Para este povo, o céu, que é sustentado pelas forças espirituais que garantem ordem e o equilíbrio do mundo, está prestes a despencar. Assim, como para os Yanomami, há um mito dos indígenas Cariris sobre a “pedra da Batateira” (Cariry, 2019) sustentada ancestralmente pela cauda de uma grande baleia. Este ser que sustenta a pedra é quem impede as águas subterrâneas de invadir o vale do Cariri cearense. Tanto o desabar dessa ‘pedra’, convergente com o mito sobre o desabar do teto do céu, que é sustentado, suspenso e considerado aos pedaços pelos xamãs Yanomami, revelam caminhos, palavras e visões diferentes, mas é perceptível que apontam para uma mesma situação catastrófica! Com o aumento da temperatura e as consequências da degeneração dos ecossistemas no mundo inteiro, anunciadas pelos estudos científicos do clima e pela própria realidade dos desastres ambientais – a exemplo da COVID-19, inundações, queimadas, entre outros – tudo vem caindo sobre nossas cabeças ditas civilizadas: o céu, a pedra, o véu e finalmente a ficha! Não que essa ficha já não tenha caído antes para muitos povos de Abya Yala4, desde o massacre da colonização de um povo originário que se fez caboclo, nordestino – peregrinos e retirantes da seca.

Nesse sentido, os dados e as informações que vêm apresentando essa mutação, explicam o debate científico em torno do que passamos a chamar, a partir do ano 2000, de acordo com os meteorologistas Paul Crutzen e Eugene Stoermer, de uma nova era geológica – o antropoceno5. Trata-se de “um período histórico no qual os humanos se tornaram a principal força produtora de mudanças na Terra” (Freyesleben, 2023, p. 2), no qual, do ponto de vista paradigmático, na ciência e na história, começamos a nos entender como agentes geológicos implicados com uma autoridade fundamental: a intrusão de gaia, na acepção de (Stengers, 2018); um novo regime climático, de acordo com Latour (2020); uma era do Negroceno, conforme (Ferdinand, 2022); o Chthuluceno, segundo (Haraway, 2022), entre outras designações e interpretações como Capitaloceno, Plantatioceno e Euroceno6.

Tais designações para ler esta Era do antropoceno, são concomitantes a outro mundo que nasce tão forte quanto foram as retomadas das lutas e contestações da década de 1970: a emergência de uma extrema-direita neoliberal, fascista e negacionista que se alastra pelo mundo inteiro e que nega, arrogantemente e covardemente, as mudanças climáticas e todas as consequências ambientais que o planeta está passando, incluindo, agora, o questionamento da permanência da própria espécie humana na Terra. Não que alguns da nossa própria espécie já não tenham sido extintos, como podemos constatar com a dizimação de muitas etnias pela violência colonial! Só para termos uma ideia, somente no “Brasil”, segundo (Pappiani, 2009, p. 8), havia antes da invasão europeia, por exemplo, cinco milhões de pessoas indígenas de mais de mil etnias diferentes. Se na atualidade só existem 305 diferentes etnias (IBGE, 2023), é porque com a colonização, houve um genocídio. Essa dizimação em território colonizado se deu, entretanto, não devido a uma crise ecológica, mas devido a múltiplos e contínuos genocídios patrocinados pela cultura ocidental.

Na atualidade, as mutações (Latour, 2020) reais e já amplamente documentadas pelo Painel Intergovernamental sobre mudanças climáticas – IPCC7, e outros órgãos científicos, são a nova versão planetária da qual precisamos nos fazer entender para situarmos nossas pautas. Se já constatamos que nada de grande e fundamental se fez para reverter a atual agenda do modo de operação capitalista, então, como a permacultura poderá nos conduzir diante das aceleradas degenerações? Precisamos indagar: por que embora as análises científicas estejam disponíveis e amplamente divulgadas, elas não conseguem mobilizar as pessoas para a necessária “grande virada”, mesmo comunicando a iminente tragédia encenada pelo humano? A hipótese de ficção política de Bruno Latour poderá nos ajudar a entender, conforme veremos adiante.

Por outro lado, esta nova realidade das mutações climáticas nos exige, agora mais do que nunca, que façamos das lutas ecológicas o ambiente para o encontro com as lutas decoloniais, tanto as macro como as micropolíticas e, sobretudo, como iremos criar mundos em comum no contexto de uma crescente deterioração das condições de vida na Terra. O desafio de encarar a passagem de uma etapa, que antes era de crise, para outra, de mutações, nos impõe novas bússolas para nos orientarmos em diferentes jornadas e estratégias. Precisamos de novas percepções e modos de ver o mundo, uma vez que a atual realidade estremece e estraçalha antigas convicções e verdades que julgávamos como certas há meio século. Estamos sendo convidados e convidadas a refletir e revisar antigos valores de velhas oposições, tais como natureza e cultura, sujeito-objeto, humanos e não-humanos, sustentabilidade e regeneração, fratura colonial e ambiental, entre outras dicotomias que desabam com a emergência do aquecimento global. Nesta nova conjuntura – política, cultural e ambiental – necessitamos, portanto, olhar para o mundo com outras lentes, soltar os antigos pressupostos e suas certezas para usar diferentes ontologias e abordagens críticas, a exemplo do relativismo natural e/ou multinaturalismo, da visão multiespécie, da perspectiva da ecologia decolonial, do redesign de culturas regenerativas, do ecofeminismo, da esperança ativa, da micropolítica, entre outras cosmovisões e perspectivas do pensamento contemporâneo8.

Estas e outras formas de abordagens que anunciam outras maneiras possíveis de viver nesse planeta, são parte das grandes ideias para adiar o fim do mundo – para usar um termo de Ailton Krenak – aos quais a permacultura se soma para realizar seus diálogos e composições nesse século XXI. Isso nos permitirá acionar novas bússolas orientadoras para repensar este mundo em mutação, um mundo que tomba, seja de cima para baixo, do céu para terra, como de baixo para cima, vindo do mar subterrâneo, onde dorme a serpente que represa com sua cauda a grande pedra que segura as águas da Chapada do Araripe, segundo a cosmologia Cariri. Tudo isso tomba, cai ou rola, pela imprudência de um sistema equivocado que despreza a vida e as naturezas!

Outras ontologias – Naturezasculturas

No contexto dos estudos antropológicos clássicos, aprendemos que cultura é algo exclusivamente humano – práticas, costumes, símbolos, hábitos e comportamentos de pessoas vivendo em sociedades, comunidades, tribos, coletivos, entre outros. Nesse campo social os atores e atrizes são diferentes, atuando com variadas línguas, artes, crenças, ritos e mitos, enquanto a “natureza” é justamente seu oposto, se comportando homogeneamente como paisagens fixas – montanhas, rios, cachoeiras e outros (Latour, 2020). No jogo das denominações da ciência moderna, construídas pelas ideias de filósofos como René Descartes, do físico Isaac Newton, desde o século XVII (Capra & Luisi, 2014), cultura e natureza tornaram-se campos que informaram a partir de métodos reducionistas, abstratos e deterministas, que os elementos de um sistema não só estariam isolados no universo, mas também, independentes, entre si, separados. Separando cultura e natureza, separaram corpo e mente, matéria e energia, mito e realidade, humanos e não humanos, entre outros dualismos. O desafio será sair desse padrão dicotômico, posto que outras pesquisas e a própria realidade mostram não existir, no nível mais básico da vida, qualquer dualidade, como cultura e não cultura, natureza e não natureza. (Morin, 2011), um dos grandes pesquisadores do pensamento complexo, se contrapõe ao dualismo, realçando em “Os sete saberes necessários à educação do futuro”, o quanto somos 100% cultura e 100% natureza.

O que estamos aprendendo agora com a visão de saberes não antropocêntricos, é que esta antiga separação dicotômica entre coisas ditas “naturais” e “culturais” está sendo profundamente problematizada, o que permite emergir outro tipo de relativismo – o relativismo natural (Latour, 2020), que declara que assim como existem várias culturas, também são diversas aquelas coisas que consideramos apenas uma “natureza”. Latour nos explica que:

[…] a antropologia moderna em seu tratamento etnográfico, tomada por uma boa-intenção nas suas relações com culturas não-modernas, mas inescapavelmente fundada na dicotomia essencial Natureza/Cultura, lança mão do relativismo cultural, um multiculturalismo cujo oposto fundacional é a unicidade da natureza (Soares, p.221, 2020).

Esta outra noção do relativismo natural questiona a postura etnocêntrica do relativismo cultural que diz que a cultura alheia é uma “outra em relação à nossa, mas a natureza do outro é tal qual a nossa (mesmo que estes discordem” (Soares, 2020, p. 221). Essa versão etnocêntrica da cultura, segundo Latour, faz parte de uma “crença de um mundo natural único” – um pensamento proveniente da ciência, ou melhor, de uma definição errônea das ciências ocidentais que nega a ideia de pluriverso9 (Latour, 2018, p. 435–436).

Na crítica indígena o pensamento dos povos originários tem desafiado estas noções ocidentais dicotômicas acima mencionadas, com outros sistemas de saberes ontológicos que retratam diferentes versões da(s) natureza(s), conforme podemos verificar nos grandes livros de Davi Kopenawa A queda do céu e O espírito da floresta, obras publicadas em parceria com o antropólogo francês, Bruce Albert. Estas cosmovisões explicam um tipo de ecologia ancestral e espiritual a partir dos espíritos da floresta, os xapiri pe, e a sua comunicação entre o que é humano e não-humano. Kopenawa ressalta, sobre a civilização dos brancos:

O que vocês chamam de ‘natureza’ na nossa língua é urihi a, a terra-floresta e também sua imagem vista pelos xamãs Urihinari a. É porque essa imagem existe que as árvores estão vivas. O que chamamos Urinarihi a é o espírito da floresta: os espíritos das árvores huutihiri pe, das folhas yaahanari pe e dos cipós thoothoxiri pe (Kopenawa & Albert, 2023, p. 32).

A citação de Ailton Krenak no trecho do seu livro Futuro ancestral (Krenak, 2022) nos mostra como a cosmovisão do seu povo apresenta outra ideia sobre a vida, a natureza, a cultura, o tempo e a ancestralidade:

Os rios, esses seres que sempre habitaram os mundos em diferentes formas, são quem me sugerem que, se há futuro a ser cogitado, esse futuro é ancestral, porque já estava aqui. Gosto de pensar que todos aqueles que somos capazes de invocar como devir, são nossos companheiros de jornada, mesmo que imemoráveis, já que a passagem do tempo acaba se tornando um ruído em nossa observação sensível do planeta. Mas estamos na Pacha Mama, que não tem fronteiras, então não importa se estamos acima ou abaixo do rio Grande; estamos em todos os lugares, pois em tudo estão os nossos ancestrais, os rios-montanhas, e compartilho com vocês a riqueza incontida que é viver esses presentes (Krenak, 2022, p. 11–12).

Segundo Latour, o que nos impede de ver o multinaturalismo da “natureza” é o fato de que ainda a concebemos como um lugar de recurso, lugar de uso, homogêneo, fruto, claro, da nossa maneira ocidental de pensar e construir mundos dicotômicos. Trata-se, segundo este autor, de uma visão herdada da percepção política moderna, que explica a “natureza” como uma materialidade inerte, um pressuposto nascido no século XVII, que embora vigore ainda hoje, sobretudo no ocidente, não quer dizer que seja a única versão da natureza. Essa versão entra em choque quando passamos a compreender que a natureza, que julgávamos um mero cenário, subiu ao palco reivindicando seu papel de co-protagonista na trama” (Costa, 2021, p. 3), nos fazendo ver que ela também tem agência e que precisamos compreender natureza e cultura sem dicotomias.

Existe uma grande diversidade de cosmovisões de povos que a veem não só como diversa, mas como “parente”, ou mãe – a Pachamama, sempre viva, atuante, farta e abundante – ou como nos termos de Latour e outros autores, como agente político. Mas a versão não foi sempre essa; antes, até o século XVI, a natureza se definia como um conceito que:

[…] ainda podia abarcar uma cadeia de movimentos; esse é o sentido etimológico da natura latina ou da phusis grega, que se poderia traduzir por origem, geração, processo, curso das coisas. Todavia, a partir do século seguinte, o uso da palavra ‘natural’ passou a estar cada vez mais reservada à investigação de um único tipo de movimento considerado do exterior (Latour, 2020, p. 85).

No contexto atual, entretanto, “nesta nova época e sob este novo regime, a natureza não pode mais ser pensada como fonte de recursos a explorar ou espaço a proteger” (Costa, 2021, p. 3), uma vez que ela já mostrou seu protagonismo e suas agências. Essa versão de recurso, apenas mantém a velha dicotomia cultura-natureza, que nos impede de ver, segundo a crítica latouriana, as redes internas – os pluriversos- se agenciando, se movimentando… É essa mentalidade separacionista que coloca a natureza como desvinculada das redes de conexão, que está sendo profundamente questionada, uma vez que esta natureza tem agência e não é algo pré-existente, como uma mera paisagem que o capitalismo explora e disponibiliza como mero produto.

Assim, quando se fala em relacionar os dois campos – natureza e cultura – para apresentar uma visão mais simbiótica da vida, é necessário também, decolonizar esses dois conceitos modernos e desentendificá-los de uma gramática que é escriptocêntrica, moderna, patriarcal, entre outras. Será preciso integrá-las, sem dicotomia, no sentido dado por Donna Haraway de culturasnaturezas10 (Oliveira, 2022). No prefácio da tradução brasileira do livro O cogumelo no fim do mundo, de Anna Tsing, reforça que:

Romper com esse dualismo, por sua vez, implica corroer nossa pressuposição de que a espécie humana é excepcional, pois a única dotada de cultura. Mundos são sempre mais que humanos, e é preciso atentar para as relações entre espécies; outras formas de vida podem nos ensinar algo, e os fungos parecem ser bons aliados para lidar com um mundo que se despedaça (Oliveira, 2022, p. 10).

Apesar de todo um investimento em promover uma cultura e ciência dicotômicas, que vigorou e que ainda vigora na educação oficial, já chegamos a um nível de problematização e compreensão que permite a promoção de outras abordagens que tratam de uma ciência não antropocêntrica (Domanska, 2013). Já podemos aceitar o fato de que não são somente os humanos que podem ter uma historiografia, mas todos aqueles que antes denominamos genericamente como “natureza”. Gaia, como geohistória, não é só a história dos humanos, mas também dos não-humanos. Estamos falando de uma “era da nova questão geo-social”, diz Latour (2020, p. 78).

Nessa nova compreensão em que consideramos novas bússolas, a crítica à “dupla fratura colonial e ambiental” trazida por Malcom Ferdinand (2022), é algo importante para nós permacultores. Essa fenda diz respeito à “distância entre os movimentos ambientais e ecologistas, de um lado, e os movimentos pós-coloniais e anti racistas, de outro, os quais se manifestam nas ruas e nas universidades sem se comunicar” (Ferdinand, 2022, p. 23). Essa falta de comunicação entre as duas esferas, segundo Latour (2020) dá-se justamente devido à maneira pela qual estes dois movimentos conceberam “à ‘natureza’, vista sem agência, sem ação alguma” Para o autor:

Toda vez que precisamos contar com a potência de agir de atores não humanos, encontramos a mesma objeção: ‘Nem pensem nisso, trata-se de meros objetos; eles não podem reagir’, tal como dizia Descartes a respeito dos animais, alegando que eles não poderiam sofrer (Latour, 2020, p. 81).

Na sua crítica decolonial, Malcon Ferdinand (2022, p. 47-53) denuncia a colonização européia das “Américas” como um habitar colonial que se efetivou pela propriedade privada da terra, o estabelecimento das plantations e a superexploração massiva humana. Ele aponta, inclusive, a obra Primavera silenciosa, de Rachel Carson, como sendo aquela que, “a despeito de todas as qualidades literárias e políticas” deste que é o “livro fundador” do ambientalismo nos Estados Unidos, notadamente, “os perigos da poluição química causada pelo uso compulsivo de pesticidas, estão totalmente desconectados das lutas dos pretos estadunidenses pelos direitos civis em curso no momento de sua publicação” (Ferdinand, 2022, p. 145). Bruno Latour reforça a existência dessa fenda, ressaltando que os dois campos – cultural e ambiental – atuaram como “conjuntos distintos”, apesar de ambos estarem seguindo “um mesmo e único vetor – o da modernização e o da emancipação” (Latour, 2020, p. 71).

Não pode haver diálogo quando existem esferas excluídas, em competição ou negação. Nesse sentido, uma ecologia decolonial, política ou multinaturalista, é tanto uma tentativa de não separar campos historicamente separados, como permite revisar os significados discursivos desses campos – como cultura e natureza, com fins de esvaziar suas esferas de limitações, preconceitos e violências. Se não decolonizarmos a palavra, a gramática e os sentidos de uma dominação, então, as palavras em si serão apenas uma mera grafia, um tipo de fake news ecológico e cultural. Mudar a percepção das duas esferas é, primeiramente, reconhecer que a cultura tem um papel fundamental nesse jogo de associações e oposições e é ela quem exerce um poder que atualmente ainda é tanto colonial-racista, patriarcal, como especista, moderno e antropocêntrico, narcisista.

Uma hipótese de ficção política

Como uma das bússolas a nos guiar nessa nova conjuntura de “mutações”, apresento aqui a hipótese de ficção política, publicada no livro Onde aterrar?, de Bruno Latour (2020, p. 10-11), que explica alguns acontecimentos políticos como sintomas de um mesmo processo histórico: o Brexit – que foi a saída da Grã-Bretanha da União Europeia-, a eleição de Donald Trump, em 2016, nos Estados Unidos, a explosão das migrações e o acordo de Paris, na COP21-, (Latour, 2020, p. 10). Além disso: a “desregulamentação”11 da economia, a explosão da desigualdade social e a negação climática, tudo isso, logo após a queda do muro de Berlim, são acontecimentos que se interligam e fazem parte de uma mesma prática política conduzida por uma elite obscurantista, segundo este autor. Esta elite não está desinformada, ao contrário, ela sabe exatamente da real situação mundial, sobretudo do clima, mas decidiram, no entanto, optar por duas posições radicais: primeiro a de que quem deve pagar essa conta colonial são os já historicamente massacrados- os colonizados-, e em seguida, passaram a negar tudo, o que permite com essa decisão, não promoverem investimentos ambientais e culturais. Eles constataram que a história não conduziria mais a um destino comum “em que ‘todos os homens’ poderiam prosperar igualmente” (Latour 2020, p. 10). Diz ele:

Nossa hipótese de que esses adeptos da globalização estão conscientes da mutação ecológica, e que todos os seus esforços nos últimos 50 anos consistiram em negar a importância das mudanças climáticas e, ao mesmo tempo, em escapar de suas consequências, construindo fortalezas que possam a garantir seus privilégios, bastiões inacessíveis àqueles que terão que ser deixados para trás” (Latour, 2020, p. 129).

Diante desta realidade, Latour conclui que não poderemos entender mais “nada dos posicionamentos políticos dos últimos cinquenta anos, se não reservarmos um lugar central à questão do clima e à sua degeneração”, posto que a questão climática está “no centro de todos os problemas geopolíticosao qual à questão não só ecológica, mais as injustiças e desigualdades sociais estão ligadas. (Latour, 2020 p. 12). Diante dessas constatações é que podemos entender porque os problemas ambientais detectados ainda na crise – no século XX – não foram resolvidos e, ao revés, só se agravaram! Podemos compreender, agora, porque as consequências que atestam desertificações de biomas, acidificação de mares, destruição de ecossistemas, mas também, desigualdades sociais, migrações, guerras, entre outras mazelas, só aumentaram!

Se no início dos anos 80, o ambientalismo oficial pregava um “futuro comum”12 anunciado pelo relatório Brundtland, este “futuro” passa a ser totalmente ignorado pelos obscurantistas, que sequer fingem seu desinteresse pelas questões climáticas, como pudemos constatar, no lamentável episódio dos EUA, que em 2017, por meio do seu presidente Donald Trump,

se desresponsabilizou das suas emissões de gases de efeito estufa, uma das mais altas do planeta, cerca de 13%13 (Latour, 2020), saindo do acordo de Paris. Nesse sentido, esta bússola que nos guia – a hipótese – revela, pelo menos dois fenômenos combinados mais desiguais: a mutação climática por um lado, e por outro, o negacionismo, e embora ocorram de forma simultânea, são fenômenos diferentes na medida em que um anuncia um caos, e o outro, ao negar taxativamente este anunciado científico, sugere, um tempo de catástrofes, para usar um termo de Isabelle Stengers (2015). Caos e catástrofe passam a ser dois lados de uma mesma moeda.

Diante desse contexto de ficção política, Latour pergunta: “devemos continuar alimentando grandes sonhos de evasão ou começamos a buscar um território que seja habitável para nós e nossos filhos?” (Latour, 2020 p. 14-15). O que iremos nós – aqueles que verdadeiramente não são os responsáveis por essas destruições climáticas, mas os principais atingidos – fazer? Essa nova realidade, do clima e da negação de sua mutação, vai exigir dos que pretendem permanecer na Terra, traçar suas rotas e começar a indagar: onde aterrar? (Latour, 2020). Se a elite obscurantista não quer conservar “o pertencimento a uma terra, a um lugar, a um solo, a uma comunidade, a um espaço, a um meio, a um modo de vida” (Latour, 2020, p. 25), nós do outro lado do front da modernização, queremos! Se a elite virou as costas, ignora ou nega o fenômeno do novo regime climático, nós, os permacultores, temos algumas das soluções para compor com diferentes líderes, ativistas, ecologistas, povos tradicionais, humanos e não-humanos nossa permanência na Terra.

Não ficaremos quietos, esperando que tudo acabe bem no final, sem nos movermos, apenas fechados em nossos sítios, alheios a esta realidade mutante. Iremos precisar nos reinventar, buscar o ativismo político, as políticas públicas, as composições diversas para ampliar o raio de penetração das práticas ecológicas nas escolas, nas praças, clubes, universidades, bibliotecas… em cada canto desse planeta com fins de mitigar o novo regime climático e resistir à contrarrevolução neocolonial e negacionista da era do antropoceno.

Redesign permacultural

Destacar a visão de uma ecologia que é política, multinaturalista, decolonial e etnográfica, é importante, nesse século XXI. No antropoceno é urgente mudarmos nossa narrativa cultural, posto que, apesar da permacultura, segundo David Holmgren, ter nascido já como um ambientalismo de oposição, com seu ativismo baseado em uma ecologia profunda, as transformações nos tempos atuais irão exigir mudanças na percepção da própria permacultura. A citação de Bill Mollison sobre o sistema político é bem emblemática para falarmos de fratura colonial e ambiental na permacultura, quando ele diz:

O que chamamos sistemas políticos e econômicos está ou desemboca em nossa habilidade de conservar o ambiente natural (…) Eu não consigo pensar em uma única decisão política que seja tão importante como a decisão de tais homens (sic) em restaurar o solo, pois são os produtos deste solo que permitem aos políticos sobreviverem” (Mollison, 1979 como citado em Ferreira-Neto, 2018, p. 269).

A percepção de Bill Mollison é contextual e temporal, claro! Se insere na perspectiva de um conservacionismo ambiental próprio do seu tempo que se resume, nessa fala, à defesa dos solos como principal bandeira – um tema evidentemente importante – porém, sem se deter nas lutas sociais como integrantes da esfera ambiental. Ainda que a permacultura se caracterize por atuar em sete grandes áreas (Figura 1) – o que já demonstra uma percepção mais abrangente e sistêmica da vida – notadamente, os temas relacionados às questões de classe, raça, gênero, geração, especismo e outros, ainda são esferas a serem integradas, ampliadas, dialogadas e sistematizadas.

Nas referências da permacultura, ainda permanecem, por exemplo, pressupostos ecológicos que tomaram “forma no século XVIII em reação às destruições ambientais nas colônias sem se preocupar com as injustiças constitutivas do mundo colonial” (Ferdinand, 2022, p. 137). Superar essa percepção se torna um importante passo naquilo que deve ser ressignificado nesta ferramenta na era do antropoceno, posto que está provado como “a poluição, as perdas de biodiversidade e o aquecimento global são os vestígios materiais desse habitar colonial na Terra, compreendendo desigualdades sociais globais, discriminações de gênero e de raça” (Ferdinand, 2022, p. 201).

Figura 1: Flor da permacultura. Imagem de Holmgren, D. (2013). Permacultura: Princípios e caminhos além da sustentabilidade. Via Sapiens.

Com as mutações, teremos que fazer mudanças em nossas narrativas “através de conversas culturalmente criativas que são provocadas ao fazermos perguntas mais profundas” (Wahl, 2020, p. 28), que nos ajudem a problematizar o ambientalismo de oposição, para usar o termo de Holmgren. As críticas, epistemologias e ontologias aqui citadas, nos permitem perceber como nossa visão (de pessoas dedicadas à permacultura) do conceito sistêmico, no fundo, se limitou ao atuar apenas no campo da ecologia aplicada. Ficamos presos ao item ambiental. E indo um pouco mais fundo, sem sequer relacionar ou “se preocupar com a causa animal” (Ferdinand, 2022, p. 25), um tema totalmente ausente dos movimentos sociais e ambientais, ainda a ser problematizado na permacultura – sobretudo para re-dimensionarmos sua ética – uma vez que nesse design, estes seres não humanos entram no zoneamento, como elementos, comida ou trabalhadores (serviços gratuitos), não como agentes políticos.

Apesar da percepção sistêmica dos ecossistemas como partes integradas, na permacultura, notadamente, esta ciência em tela, ainda segue vendo a natureza como a ecologia clássica, aqui já mencionada: recurso, ambiente natural, pano de fundo, sistema de produção, entre outros. Embora se reconheça a presença de outros seres integrando e agindo entre os sistemas vivos, os agenciamentos que recuperam ecossistemas, estes não são compreendidos como promovido por existências coletivas humanas e não humanas, em rede, como sistemas simbióticos que atuam, conjuntamente como agentes políticos. Somos sempre nós, os sujeitos sociais – os humanos- que agimos diante de uma “natureza” que está à espera de nossa ajuda fundamental. Essa é mais uma das percepções antropocêntricas pelo qual a permacultura deve ajudar a combater.

Donna Haraway nos lembra que, “as tecnologias não são mediações, algo entre nós e outro pedaço do mundo. (…) as tecnologias são órgãos, parceiros plenos, no que Merleau-Ponty chamou de ‘dobras da carne’ (Haraway, 2022, p. 330). Nesse sentido – e voltando ao tema do perspectivismo antropocêntrico citado – se uma composteira é uma tecnologia social, conforme a permacultura, qual é o lugar que ocupam os seres orgânicos que estão trabalhando-agenciando, no interior desse sistema-técnica de fazer adubo? Além do humano, ali estão micro-seres e insetos, bactérias, oxigênio, minhocas, milhares de fungos e outros organismos vivos multiespécies, todos fazendo as decomposições com água e restos de alimentos, coletivamente, criando a possibilidade de emergir, no mínimo, uma matéria-prima desejada: um húmus nutritivo para enriquecer o solo. Nessa composição, estamos todos juntos – humanos e outras formas de vida – mas temos a impressão cultural de que as tecnologias ditas sociais são agenciamentos puramente ou basicamente humanos. Mas não o são. Por meio da biologia e da própria permacultura como este lugar de observação dos múltiplos agentes e saberes, podemos detectar os exemplos de vidas que agenciam os processos de composição, que atuam como “dobras”, como conversores para ciclos interativos que, em rede, se somam em suas específicas competências para a geração de vidas. São, segundo (Souza, 2020), “tecnologias vivas”, mais do que “tecnologias sociais”, ali se afetando, entre humanos e não humanos.

Nessa reflexão sobre “tecnologias vivas” trago aqui o exemplo de Bill Mollison, que explica, na Figura 2, as funções e características do ser-galinha. Ela, a galinha – e poderia ser uma vaca ou qualquer outro animal – funciona basicamente numa ótica pecuarista, ou seja, como produto, comida, trabalho, e claro, está sempre a serviço dos humanos! Nessa percepção os animais são meros alimentos de um conjunto de possibilidades para usufruto e consumo! E lembrando que, justamente porque na ciência moderna a “natureza” se comporta como objeto, tudo o que não é humano – nessa moralidade vigente milenar – não sofre ou sente dor, e claro, também, não tem direitos, o que é uma versão antropocêntrica desse mundo “civilizado”! Nesse sentido, pode-se dizer que, de fato, a galinha é tudo isso que se disse dela, na Figura 2 , mas há que refletirmos e questionarmos esta versão do estatuto moral humano (civilizado), que imprime a este ser – e a outros – o sentido de mercadoria. Nessa percepção pecuarista a galinha é somente um recurso, parte de uma engrenagem e tem pouco a ver com a vida ou o bem-estar dela e de sua espécie, segundo pode nos valer, nesse diálogo, a ética14 Animal – um campo de debates destacado na década de 1970, com as contribuições científicas de Peter Singer. Embora o conceito de veganismo caiba bem a essa reflexão da galinha, estamos problematizando o campo mais amplo da permacultura, que é o da sua ética: “Cuidar de si e do outro”. E quem é o “outro” na permacultura?

Figura 2: Características, necessidades e produtos de uma galinha para considerar sua inserção em relação aos outros elementos do sistema permacultural. Fonte: (Mollison, B., 1988, p. 18).

Este diálogo nos permite esgarçar o cosmos da permacultura – que ainda se apresenta com uma ética bem-estarista, e, portanto, antropocêntrica – para problematizar seja as existências não-humanas, como as resistências humanas que se dão pelo viés da cultura especista, que é quem naturaliza sistemas alimentares baseados em vidas abatidas. Em uma sociedade – para além de racista e machista – antropocêntrica, os animais continuam a ser escravizados, torturados e assassinados friamente, de forma naturalizada para mero consumo.

Ainda é difícil inserir o direito animal no paradigma antropocêntrico! Em nossas sociedades industriais é ainda alto o uso e a produção para consumo, em alta escala, de proteína animal; dos maus tratos para com estes seres, da poluição dos oceanos pelos excrementos vindos da pecuária, devastação das florestas para pastos e monoculturas, entre outras mazelas das quais a permacultura deve se opor veementemente e enfrentar os desafios provenientes do agronegócio, cuja pecuária se destaca. Devemos trazer para o centro da pétala outras éticas que não sejam de vantagem meramente humana. A questão ética na permacultura ainda é monoculturalizada, quer dizer, centrada só no humano. Mas já existe, desde Pitágoras, o debate da ética animal (Felipe, 2006). É um debate, também, do veganismo e agora, pelo novo regime climático, da ecologia e também da permacultura. Este tema não é em vão no antropoceno, uma vez que a própria ONU apresenta como expectativa para 2050 a diminuição em 50% no consumo de carne, segundo consta no relatório sumário da comissão EAT-Lancet (Willett et al., 2019) que ressalta:

A transformação para dietas saudáveis até 2050 vai exigir mudanças substanciais na dieta. O consumo geral de frutas, vegetais, nozes e legumes terá que duplicar, e o consumo de alimentos como carne vermelha e açúcar terá que ser reduzido em mais de 50%. Uma dieta rica em alimentos à base de plantas e com menos alimentos de origem animal confere benefícios à saúde e ao meio ambiente (Willett et al., 2019, p. 3)

A diminuição de carne na mesa humana, não será pelos mesmos motivos veganos – compaixão – mas pelo viés ambiental uma vez que a pecuária tem sido uma das principais responsáveis pelas estatísticas de danos na camada de ozônio, causadas pelo metano, pelo uso excessivo de água, desmatamento para pastos, entre outros índices que ampliam o aquecimento global. O professor Alexandre Costa, pesquisador do IPCC, realça, em uma entrevista a Unisinos (Santos, 2020), que

A crise climática segue se agravando justamente em função de um modo de vida intensivo em carbono, desde a demanda de energia para produção de bens de consumo, passando pelo transporte, até chegar num sistema de produção alimentar altamente predatório, com desmatamento para expansão da fronteira agrícola e consumo de carne em uma quantidade cada vez mais insustentável. Então as causas, embora não sejam exatamente as mesmas, guardam ligação entre si.

Embora ainda estejamos nesse regime alimentar predatório, a tendência deverá ser diminuir o consumo de produtos animais, aumentar o aporte de vegetais, recuar na pecuária intensiva e avançar nas agroflorestas, na agroecologia, agricultura orgânica e outros sistemas alimentares. Trata-se, portanto, de um passo fundamental da pauta no contexto do novo regime climático que implica em respeito multiespécie e escuta ativa a todos aqueles que propõem, de maneira ampla, distribuída e inovadora, tomar outros seres que não-humanos como “agentes políticos”, e não meros objetos funcionais, como o exemplo da galinha.

Nesse sentido, a permacultura, no entendimento ecológico na era do antropoceno, necessita de outras receitas éticas, sobretudo quando ainda se definem zoneamentos com animais para sistemas de serviços e alimento aos humanos. Os animais devem estar presentes no zoneamento permacultural, mas não como meros objetos. Estamos falando não só de diversidade cultural, agora, entramos na era do respeito à diversidade multiespécie, para usar um termo de Anna Tsing (2022).

O reconhecimento de não-humanos como agentes políticos – e não objetos utilitários, como a ave citada – explica um salto na consciência humana, justo porque ambos, nesse contexto, se equivalem, pois são agentes. Essa visão – ou biovisão – em que determinados seres antes vistos como “coisas”, “objetos”, são chamados ao palco, agora como atores – como o vírus do COVID 19 – e não mais meros desenhos de fundo, é uma nova revolução paradigmática, dialógica e multiespécie, no enfrentamento do novo regime climático. Essa outra percepção da vida e do planeta, nos permite problematizar a exclusividade do homo-sapiens-sapiens, uma vez que são agentes, também, as “rochas, as pedras, gatos…”, na medida em que “todas essas coisas agem e interagem” (Pickering, 2013, p. 79). A perspectiva das agências políticas implode o humano do ego(cêntrico) e tipo de reinado, onde ele era o monarca.

O antropoceno é patriarcal

A centralização do sujeito humano não se dá só como espécie privilegiada, mais no tocante ao gênero masculino, branco, ocidental, como centro da perspectiva moderna, assentada numa posição científica por meio do que se chama de “ciências humanas”, questionada hoje pelas ciências não-antropocêntricas.

Segundo Latour (2022, p. 162) “os organismos fazem seu ambiente, não se adaptam a ele”. O ambiente não é algo dado, simplesmente, ele é constituído por forças de agências coletivas, humanas e não humanas. A Terra está viva, afirma Lovelock & Tickell (2006)15, em sua teoria de Gaia, que trouxe a noção da Terra como um sistema em evolução, com vida autorreguladora. Apesar dessa teoria ter sido formulada na década de 1970,

Os cientistas só reconheceram a Terra como entidade auto-reguladora na Declaração de Amsterdam, em 2001, e muitos ainda agem como se o nosso planeta fosse uma enorme propriedade pública que possuímos e compartilhamos. Eles se aferram à sua visão dos séculos XIX e XX da Terra, ensinada na escola e universidade, de um planeta constituído de rocha inerte e morta, com vida abundante a bordo: passageiros na jornada desse planeta através do espaço e do tempo (Lovelock e Tickell, 2006, p. 18-19).

Importante que se diga que a crítica ao antropocentrismo não é para combater o humano, mas para lembrá-lo, sobretudo, de que não estamos sozinhos no planeta, somos ecossistemas humanos e não-humanos. É para questionar o fato de que alguns dessa espécie se considerem mais merecedores que outros, como os homens, os brancos, ou ocidentais, sujeitos masculinos criadores de Estados-Nações, que oprimem parcelas da sociedade por androcentrismos, racismos e colonialismos. Estes Estados-Nações são patriarcais e as comunidades colonizadas são educadas pelo programa antropo-falo-logocêntrico, para usar um termo da Suely Rolnik (2018), desde as macro e micropolíticas do capitalismo. Há um programinha da cafetinagem rodando pelo status quo. O que precisamos é denunciar essa educação que impõe violências simbólicas, de gênero, raça, especismo, entre outros. É preciso lembrá-los (aos patriarcados), que eles não estão sós, e que todos dependemos dos elementos primordiais da existência: o oxigênio, as plantas, os minerais, a água, a terra, ou seja, tudo aquilo que nos cerca e que, de uma maneira ainda errônea, denominamos apenas como coisas não-humanas.

Segundo Domanska (2013, p. 10), a atitude antropocêntrica “apresenta a espécie humana como o centro do mundo, desfrutando de sua hegemonia sobre os outros seres e funcionando como mestres da natureza que existe para atender às suas necessidades”. O antropocentrismo é uma espécie de monarquia humana entre as outras espécies, um czar entre as naturezas. Por isso, a percepção do conceito de agentes políticos descentra o humano, sobretudo o humano masculino, uma vez que o que foi gerado nessa era industrial de guerras e saques foi uma gestão marcadamente masculina.

O patriarcado é um agenciamento de biopoder – e melhor agora é dizer, geontopoder (Povinelli, 2022), no antropoceno. Notadamente, foram os homens – e não as mulheres – que criaram as corporações, as guerras, os governos e as instituições dos Estados-Nações da modernidade. Como diz os versos da poetisa (Silva, 2005):

Mulheres fazem o mundo

Fazem o globo girar

Fazem tudo num segundo

Fazem a vida durar

Mulheres não fazem guerra

Fazem nascerem na terra

Os frutos do verbo amar

Não podemos deixar de ver na permacultura, ainda, os profundos rastros não só do antropocentrismo, por meio de sua ética, como também dos seus rastros androcêntricos ao constatarmos o quanto sua imagem central é marcadamente masculina, ainda que saibamos da existência e presença feminina no seu interior. Há, ainda, pouco destaque à contribuição das mulheres nesse campo, mas isso ocorre no movimento ambiental de uma maneira geral, apesar de haver mulheres como Maria Thun16, Raquel Carson, Ana Primavesi, Rosemary Morrow, Simin Fadaee, Su Dennet, Starhawk, Lucia Legan, Masha Hanzi, Joanna Macy, Flávia Vivacqua, Vandana Shiva, Nena Alava e tantas outras, assim como eu, que praticam permacultura. Há ainda, essas fraturas no movimento ecológico e na permacultura, consequentemente. Há muitos paradoxos a serem enfrentados nessa época no antropoceno, e um deles é que o humano-homem terá que se abrir para o feminino ou matrístico. Como disse Latour “Noé dos novos tempos, é mulher”! Nesse caso, nosso lugar não é nem na arca, nem no convés de qualquer navio – este lugar de marinheiros, piratas, homens… – é na Terra: que é mãe, prima, tia, avó, neta, filha, sogra… a Pachamama de todas as tribos e clãs, a terra-floresta dos Yanomami, dos Cariris…, mas não a mesma mãe-terra do discurso binário do patriarcado que imagina essa Terra-natureza feminina-frágil ou entidade a ser dominada e explorada.

Algumas conclusões: con(fiando) em novos mundos para a grande virada

Assim como não estamos mais na crise ambiental, e sim nas mutações, segundo Bruno Latour, também já não estamos mais no contexto da sustentabilidade, segundo Daniel Wahl (2019)17, uma fase que já ficou para trás, precisamente porque nada de notável se fez, nada de impactante se processou para reversão das degenerações dos ecossistemas, que só aumentam. O trem passou, velozmente, e sequer a transformação mais importante aconteceu plenamente, que é antes de tudo “fazer um redesign da presença humana na Terra” (Wahl, 2019, p. 25) para

Questionar profundamente a nossa maneira de pensar, a nossa visão de mundo e o nosso sistema de valores. Mudanças nos nossos modelos mentais, crenças básicas e suposições sobre a natureza da realidade (Wahl, 2019, p. 25).

Contudo, e apesar das fraturas ora mencionadas, a permacultura é um desenho ecológico que prima pela percepção sistêmica e mesmo tendo questões a serem problematizadas isso não a invalida, ao contrário, pois a permacultura sempre se reinventou. A atenção redobrada no antropoceno faz parte das exigências desta terceira grande onda tardia da permacultura, que traz para nós a pauta da “grande virada” paradigmática, que deve estar movida e guiada, segundo Joanna Macy e Chris Johnstone, por uma esperança ativa, que é uma visão, segundo ela, que deve ser entendida como uma prática:

Como o tai chi ou a jardinagem, é algo que fazemos em vez de algo que temos. É um processo que podemos aplicar a qualquer situação e envolve três etapas principais. Primeiro, buscamos uma visão clara da realidade; segundo identificamos o que esperamos em termos de qual rumo gostaríamos que as coisas tomassem ou de que valores gostaríamos de ver expressos; e, terceiro, damos passos para nos movermos ou a nossa situação para esta direção (Macy e Johnstone, 2020, p. 13).

Joanna Macy e Johnstone (2020) dizem: o que deve nos mover é a “intenção”. Nós devemos escolher “o que pretendemos provocar, fazer ou expressar. Em vez de mensurar nossas chances e prosseguir apenas quando nos sentimos esperançosos, nos concentramos em nossa intenção e deixamos que ela seja nosso guia” (Joanna Macy e Johnstone, 2020, p. 13). Nesse sentido, situamos a permacultura como essa plataforma de inovação transformadora, agência geossocial, ideia “para adiar o fim do mundo” ou cosmopolítica de relações que se reinventam e redefinem a nós – seus agentes políticos e terrestres – que se dedicam às práticas permaculturais. Quer dizer, uma permacultura que denuncie a dupla fratura, que politize a ecologia, que resgate os mestres e intelectuais orgânicos, locais, como a permacultura dos beatos do cariri; que se oponha ao neoliberalismo, fascismo e negacionismo, que traga o debate entre humanos e não humanos, promova novas ontologias, reconheça que a luta é tanto macro como micropolítica, e que sobretudo, se situe no Novo Regime Climático.

A permacultura é um chamado para re-existências e co-habitações, por isso que necessita neste século XXI, esgarçar alguns aspectos fundamentais da sua cosmovisão para que possa enxergar todas essas mutações para além dos óculos de um biopoder, mas sim do que já se denomina, como um geontopoder – “essa crise da governança da vida e da não-vida”, segundo Elizabeth Povinelli (2023, p. 266). Se há uma guerra de mundos, conforme afirma Bruno Latour (2020), nós, da permacultura temos um lugar, temos saídas e tecnologias sociais, vivas e políticas, que poderão aterrar-nos. Isso exigirá, entretanto, que comecemos a grande tarefa de nos reinventarmos para re-co-ocupar, re-co-habitar e re-co-assentarmos como terrestres18 nossos próprios territórios. Estamos no ponto da “grande virada” (Macy e Johnstone, 2020), pois assim como o tempo é de uma era de catástrofes, também o é de esperanças. O contexto que diz sobre destruições é o mesmo que se pode dizer, também, sobre regenerações (Wahl, 2019), e é dentro do que Latour (2020) chama de “gestos que barrem”, que devemos construir políticas para uma permacultura de urgência na emergência climática.

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1 – Universidade Federal do Cariri (UFCA) – francisca.fanka@ufca.edu.br

2 – Sigla para identidades: Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros, Queer ou Questionadores, Intersexuais, Assexuais, dentre outros.

3 – Donella Meadows é autora ao lado do seu esposo, Dennis Meadows, Jorgen Randers e Willian W. Behrens III, da pesquisa conhecida como The limits to Growth, encomendada pelo Clube de Roma ao Massachusetts Institute of Technology, em 1972. Sanson, C. (2022). O primeiro relatório sobre os limites do crescimento completa 50 anos [Instituto Humanitas Unisinos].

4 – “Abya Yala, na língua do povo Kuna, significa Terra madura, Terra Viva ou Terra em florescimento e é sinônimo de América (…) Abya Yala vem sendo usado como uma autodesignação dos povos originários do continente em oposição a América, expressão que, embora usada pela primeira vez em 1507 pelo cosmólogo Martin Wakdseemüller, só se consagra a partir de finais do século XVIII e inícios do século XIX, adotada pelas elites crioulas para se afirmarem em contraponto aos conquistadores europeus, no bojo do processo de independência. Muito embora os diferentes povos originários que habitavam o continente atribuíssem nomes próprios às regiões que ocupavam – Tawantinsuyu, Anauhuac, Pindorama –, a expressão Abya Yala vem sendo cada vez mais usada por esses povos, objetivando construir um sentimento de unidade e pertencimento” (Porto-Gonçalves, 2009, p. 29).

5 – Confira esse debate em Conversa sobre o AntropocenoJosé Eli da Veiga.

6 – Para cada um destes conceitos existe uma vasta literatura e os leitores podem acompanhar esse debate rico através destes autores. Tais conceitos apresentados em sequência não indicam que são sinônimos ou correlatos.

8 – Respectivamente informados por (Latour, 2020; Castro & Danowski, 2014; Kopenawa & Albert, 2015; Tsing, 2022; Ferdinand, 2022; Wahl, 2020; Haraway, 2022; Macy & Johnstone, 2020; Rolnik, 2021).

9 – Os organizadores do livro A World of Many Worlds, organizado por Marisol de La Cadena e Mario Blaser (2018) “inspiram-se no convite zapatista e definem o pluriverso como mundos heterogêneos unindo-se como uma ecologia política de práticas, negociando seu difícil estar junto na heterogeneidade. A oportunidade do pluriverso surgiria, paradoxalmente, diante da acentuação do colapso ecológico no Antropoceno” (Morel, 2023, p. 3).

10Haraway, D. (2022). Quando as espécies se encontram. Ubu Editora.

11 – Parte desta análise já foi referida por David Holmgren (2013), quando abordou o que ele chamou de 2ª onda do movimento ambiental e a “subida da revolução Friedmanita” (Holmgren, 2013), responsáveis pelas políticas neoliberais implementadas por Ronald Reagan e Margaret Thatcher.

12 – Comissão Mundial sobre o meio ambiente e desenvolvimento. Nosso futuro comum. Editora Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro-RJ, 1991.

13 – Em 2021 este país retornou ao acordo, a política negacionista permanece crescente no mundo inteiro, mesmo com a COP 28 de 2023, tendo retomado o debate sobre o limite da temperatura.

14– Felipe, S. T. (2009). Antropocentrismo, Sencientismo e Biocentrismo: Perspectivas Éticas Abolicionistas, Bem-Estaristas e Conservadoras e o Estatuto de Animais Não-Humanos. Páginas de Filosofia, 1, 2–30. https://doi.org/10.15603/2175-7747/pf.v1n1p2-30

15 – Teoria criada por James Lovelock e Lynn Margulis.

16 – Introduziu o calendário astrológico da agricultura biodinâmica a partir das ideias de Rudolf Steiner.

17 – Confira o livro Design de culturas regenerativas de Daniel Christian Wahl sobre esse debate entre sustentabilidade e regeneração.

18 – Termo utilizado por Latour para designar aqueles – humanos e não-humanos – que vão resistir ao novo regime climático.